domingo, 12 de abril de 2009

CAMPOS DE GUERRA


1- Natural

Sei que a guerra só tem um sentido
matar/morrer
e tem como melhor metáfora uma moeda sempre lançada para cima a cada instante

E muito particularmente admito um segundo sentido
completamente contrário daquele
a guerra adquire uma outra metáfora
aquela da semente
mais tarde se transforma em inúmeras outras sementes

2- Ficcional

Não faça alarde, o cão se aproxima, ele perdeu o faro.
O cão vem assoviando talvez um rap, porque assombrando gestos feito dança de nativos se embrenhando pelo mato. Os olhos acesos feito o cara bundão do filme A Dama Na Água.
Pronto, ele passou. Espera mais um instante e corra até aquele bar.
E voce?
O cão pode voltar.
Ah, não, não, voce não vai ficar vigiando. Vamos até lá.
Não. Eu trouxe meu celular, pode me ligar para conversar.
Catso, a puta que o pariu.
Ela rosnou e atravessou a avenida devagar como se chegasse à faculdade. Repetia em seu íntimo, beleza é uma situação, beleza é acontecimento, beleza é uma idéia rara. Toda cópia carece de cosmético, pensa enquanto observa as luzes, as pessoas amigas na vidraça, brindando à sua chegada.
Depois da comprimentação geral, Eloisa pergunta para ela, cadê o cão?
Ele pensa que está lá fora.
Por que não entrou?
Está se vigiando.
Ele é um amor, ?
Sim, ele faz tudo por mim.
Ela desabou. Eloisa foi sentar, pegou seu copo, bebeu com o brilho certo no olhar, para que todos percebessem sua satisfação.
Rogério levanta o copo, sua beleza merece um brinde, Eloisa.
Nada, não ganhei só a aposta, ganhei uma inimiga.
Nem pensar, não fica triste, lembra que nessa semana voce tem apresentação todos as noites.
Sim, mas ela foi tudo no livro, acho que estou cometendo uma injustiça.
Amor, ela é apenas uma personagem.
Não! Já lhe pedi para não falar assim.
Eloisa, voce realizou seu sonho. Agora voce tambem poderá dizer: beleza é um sonho.
Quem acha bonito ser escritor é ela, por favor.
Desculpe, quer que eu apareça no seu lugar.
Talvez, espera, vamos falar com ela.
Porra, Eloisa, voce sabe que ela sempre precisa consultar o terapêuta.
Eu sei falar com ela.
E o cão, depois que o encontrou perdido, ela não anda mais sozinha.
Ela não tem sonhos, vive apenas para tentar entender algo que o cão diz estar sempre dizendo.
Armando, pede licença.
Desculpe aí, mas queria me ter na conversa, perdão, me meter, ouvi voce dizer que o cão é perigoso, que ele é um coitado, vendo coisas que não existem, que tem teorias sobre outra possível dimensão da realidade, uma relidade antes dos nomes. De repente fiquei curioso, posso lhes oferecer outra cerveja?
Eloisa aponta as unhas pintadas para matar.
Armando se levanta.
Desculpem todos, vou falar com o cão, se não voltar, é porque fiquei bêbado.

3- Artificial

"(...)Havia quase um anjo.

Era ainda um homem, um homem comum, exceto pela mente inquieta e pela alma em êxtase frequente, que seu cotidiano de deveres e correrias ainda não conseguira eliminar de todo.

Começou a sentir um incômodo nos dois ombros, distensão, má posiçao no trabalho... Foi piorando e um dia olhou-se no espelho, de lado, inteiro e nu depois do banho: não havia dúvida, duas saliências apareciam em sua pele. Teve muito medo, mas decidiu não comentar com ninguem, e, como não transava frequentemente com a mulher, conseguiu esconder tudo quase um mês. (...)" Lya Luft
(do livro 13 melhores contos de Amor da literatura brasileira)

7 comentários:

Luciano Fraga disse...

O natural, a ficção e o artificial(não seria mentiroso?), tudo isto junto constrói ou destrói nossas medíocres vidas.
A verdade?
Queria original.
O fio que me conduz
é um fio de cabelo,
tingido de vermelho
um dia talvez eu deixe
escapar um feixe de arco-íris
embora possa parecer paradoxal...

Muito bom meu velho, abraço.

Devir disse...

A verdade seja dita
Antes que mentira
Seja considerada
Por outro desejo

A fonte dos desejos
Bom, natural, óbvia
Quer supor original
Até primeira tinta

No cabelo principia
A ficção da liberdade
o vermelho da alma

Grande ferramenta
reencarnação de Deus
nosso velho paradoxo

Meu caro, Luciano, é com prazer
e sabedoria que a vida origina

Devir disse...

Escrevi meu comentário do seu comentário, caro, rss, com aquela inovação frequente na minha "gramática anarquista", consciente que voce iria entender, mas como isso aqui é espaço livre de "conceitos antecipados", vou deixar uma explicação, assim como os dadaístas as tem para quem se interessar.
E como não sou dada(Deus me livre), prefiro deixar logo tudo bem entre meus pares.
Se refere ao 'verbo originar', porque se algo é original, tal se originou, se fêz, e se se manteve como a princípio(humano), onde o cérebro não é apenas um termostato, significa que o tal está o tempo todo se originando, sendo a resposta de Hamlet.
Caótico? Não.

Luciano Fraga disse...

É preciso caotizar-se para renovar-se, ou originar-se,somos malucos meu,tudo na mais perfeita desordem, abração.

Devir disse...

Imagine Tudo antes dos nomes,
do Verbo!!!
****
O apressado come crú ou se queima, é um cú

Enquanto a pá-ciência se satisfaz
o pau fode

Se ao mundo a palavra só oferece
a buceta ofende
****
Caro, maluco
****
Por favor, diga, não é foda
lutar para ter uma rela-ação
entre sentimentos que,
até que me provem ao contrário,
provém dos corpos, aqui neste ambiente virtual(?)?
(...)

Luciano Fraga disse...

Muito estranho mesmo, acreditar em tudo aquilo que você não consegue ver ou vê, mas que tem tudo haver abraço.

Devir disse...

Soa muito estranho mesmo, propor um entendimento à base do sentimento, antes das palavras, dos nomes das coisas e fenômenos, para humanos que, sob o domínio da linguagem objetiva, perderam ou se perderam na objetividade natural de sua espécie.
É inegável que sempre resta um pouco ou a esperança da volta do sentido do racional. Este, o raciocínio, jamais nos foi concedido para fazer oposição ou adestrar o animal "irracional(?)".
Aqueles que crêem que no sentimento não há matemática, tem uma visão errada da, por exemplo, Arte, excluindo as modalidades que se transformam em objeto, digo da arte de viver.
E a Vida não cobra racionalidade, tampouco "irracionalidade(?)", mas cada ser vivo deve cumprir plenamente seu sentido.
E ao sentido humano compete convergir tanto o racional quanto o "irracional(?)". Este equilíbrio de forças é fundamental para, por exemplo, se sentir feliz.
Portanto, voltando a questão da linguagem, o nome, das coisas e fenômenos, não pode ser somente objetiva, não deve ser apenas um instrumento ou ferramenta da razão.
Existem seres vivos "irracionais(?)" que, SE ACASO FOSSEM RACIONAIS, talvez fariam um melhor trabalho e arte para, por exemplo, salvar o planeta; começando, isso é racionalmente óbvio, por um infalívio controle de natalidade.

Existe a perfeição? Existe!!!
Ou, rss, existiria se este sentido de vida não tivesse tão precário sentido do NOME.
Para finalisar, tomemos outro precário sentido do nome: Amor.
Eu penso que o amor era tão somente uma das ações de salvação, quando esta é, sine qua non, ou era, infelizmente, a melhor atitude de preservação da Vida.
Mas a "roda da vida", de Chico Buarque, ou o "moinho", de Cartola, tornou tudo tão miserável.

Aquele abraço, Luciano.