quarta-feira, 7 de julho de 2010

Depois de assistir o Anti Cristo, de Lars von Trier

Ela não desiste porque ficou alienada no próprio medo de ser encontrada no próprio meio: a caverna.
Ela também enxerga além da natureza, qualquer coisa que poderia ter no nome de Deus.
Só volta à realidade depois que morrer, e para quem vive na realidade, vai esquecê-la.

"Está com os dias contados o exibicionismo do objeto de luxo para mostrar poder e exclusividade, a questão não é mais de impressionar o outro, mas de, como um artista, fazer sua opção subjetiva, e incluí-la no mundo. É aí que, em vez de repetir o mesmo, se dá a paradoxal repetição da diferença".
(não perca de ler o texto que fecha com esta reflexão, no Google)

As andorinhas vem, fazem verão, no outono
estão todas de ressaca, o inverno, o frio
uma cria coragem, se espreguiça, grita
para outra, acorda amor, a andorinha grita
cucuuuuuuu, tava dormindo? sua besta e
sozinha não faz verão, grita, grita, grita, grita
todas acordam, se espreguiçam, frio e fome
voam, todas, fazerem verões? não se atrasaram?
e o que será de nós sem as quatro estações?
então fica tu, marmota, o que posso fazer?
eu não tenho asas? chafurda na véia, no colo
da natureza, voa, eu sei voar, eu sei voar, grilo
a marmota voa, a marmota voa, quanta mentira
disse a véia, sem piscar, entra no quarto, pronto
olha aí a verdade, marmota na minha cama, trêbada
logo acorda pra temer, anda anda vai trabalhar

Bem que fui avisado pelo Luciano, que não se deve filosofar no deserto. Sermão da montanha são águas passadas.
O que se tornou uma questão de provar que este tempo não é tão agourento como pensam os românticos.
Essas águas atuais não são assim um açougue das almas, fumaça do espírito, nem a trapaça do milagre.
Tanto o milagre de existir, quanto a luz do espírito e o coração jamais estiveram enganados, sabem seus limites.
Quando tudo se resumia em fazer as escolhas certas, hoje em dia basta fazer nenhuma escolha.
Tudo bem, isso é tão engraçado, e enfim a perfeição se fez real. Ou a repetição de sempre.
E porque não sumiu os problemas de viver, tanto materiais quanto do luxo sagrado, encontramos, de volta, a natureza.
Então estão de volta as cores, os sons, temperaturas, aromas e contatos; e o vento vai vestir uniforme, e nos trazer uma só informação: está tudo tão bem dos quatro lados de cada estação; o meu, o seu, o nosso e dos outros.
Lados obscuros, por exemplo: alguém, ninguém, eu, voce, etc., são águas passadas.

segunda-feira, 5 de julho de 2010

Não se abafa apenas ruídos!

"Só não lavei as mãos e é por isso que me sinto, cada vez mais limpo"(Ivan Lins)

Sobre mãos e bocas, e cópias do que não devem ser esquecidos
(Atenção leitores, para saber o que não fui eu que escrevi primeiro, basta pesquisar no Google; por exemplo, no discurso logo abaixo à foto, voce não apenas conhecerá o autor, como também reconhecerá um ponto de vista da vida que, por razões obscuras(?), roubam-lhe para operar a alienação invisível sobre seu enfado)

Pedalando por vias virtuais, encontro cada coisa estranha, coisas que jamais esperava, mesmo levando em consideração tamanha é a minha imaginação. E, a cada dessas coisas estranhas, minha atitude jamais é julgar, mesmo que seja flagrante, sua própria inviabilidade para o convívio entre seres humanos racionais e éticos.
Também encontro coisas inevitavelmente semelhantes, pensamentos e condutas tão quão ou mais ainda generalizadas que as minhas próprias; pensamentos e condutas que possuem como princípios invioláveis a fuga honrosa ao excesso de ruídos e silêncios amedrontados e ou amedrontadores, ambos como lados de uma mesma moeda vil oferecida para a traição e inação, e, o pior, o cultivo inconsciente aos delírios, irresponsabilidades e narcisismos de uma suposta eterna juventude; este lugar que seria sagrado sem as mãos perniciosas do Mercado do Espetáculo.
Encontro, enfim, para encurtar minha febre de verdade e liberdade, em respeito aos exíguos espaços que me permitem tal doença do amor aos meus inimigos, pessoas e organizações muito dignas de confiança, mas que, ao menor sinal de chuva, dor na barriga ou afeto incondicional, perdem tal virtude, como se a houvesse adquirido simplesmente para passar numa prova única que as aprovasse vida afora. A essas pessoas tento o mais que posso ser gracioso, aproximando-me também o mais que posso da simulação geral sobre um ditado de graça, "gentileza gera gentileza", perguntando-lhes: Até tu ages feito um Brutus?
  1. A meu ver, a arte não é uma diversão solitária. É um meio de emocionar ao maior número de homens oferecendo-lhes uma imagem privilegiada de dores e alegrias comuns. Obriga, pois, ao artista a não se isolar; muitas vezes elege seu destino mais universal. E aqueles que muitas vezes elegeram seu destino de artistas porque se sentiam diferentes, aprendem cedo que não poderão nutrir sua arte nem sua diferença senão confessando sua semelhança com todos. O artista se forja nesse perpétuo ir e vir de si mesmo aos demais; eqüidistantes entre a beleza, sem a qual não pode viver, e a comunidade, da qual não pode desprender-se. Por isso os verdadeiros artistas não desdenham nada; obrigam-se a compreender em vez de julgar, e se têm de tomar um partido neste mundo, este só pode ser o de uma sociedade na qual, segundo a grande frase de Nietzsche, não tem de reinar o juiz senão o criador, seja trabalhador ou intelectual.
  2. Pelo mesmo, o papel do escritor é inseparável de difíceis deveres. Por definição, não pode pôr-se a serviço de quem faz a história, senão a serviço de quem a sofre. Se não o fizesse, ficaria só, privado até de sua arte. Todos os exércitos da tirania, com seus milhões de homens, não lhe arrancarão da solidão, ainda que consinta em acomodar-se a seu passo e, sobretudo, se o consentisse. Mas o silêncio de um prisioneiro desconhecido, basta para tirar o escritor de sua solidão, cada vez, ao menos, que consegue, no meio dos privilégios de sua liberdade, não esquecer esse silêncio, e trata de recolhê-lo e substituí-lo para fazê-lo valer mediante todos os recursos da arte. Nenhum de nós é bastante grande para semelhante vocação. Mas em todas as circunstâncias de sua vida, obscuro ou provisoriamente célebre, enjaulado pela tirania ou livre de poder expressar-se, o escritor pode encontrar o sentimento de uma comunidade viva, que lhe justificasse a condição de que aceite, na medida do possível, as duas tarefas que constituem a grandeza de seu ofício: o serviço da verdade e o serviço da liberdade. E, pois, sua vocação é agrupar o maior número possível de homens, não pode acomodar-se à mentira e à servidão que, onde reinam, fazem proliferar as solidões. Quaisquer que sejam nossas fraquezas pessoais, a nobreza de nosso ofício arraigará sempre em dois imperativos difíceis de manter: a negativa a mentir respeito do que se sabe e a resistência à opressão. Durante mais de vinte anos de uma história demencial, perdido sem recurso, como todos os homens de minha idade, nas convulsões do tempo, só me sustentou o sentimento fundo de que escrever é hoje uma honra, porque esse ato obriga, e obriga a algo mais do que a escrever. Obrigava-me, essencialmente, tal como eu era e como arranjo a minhas forças, a compartilhar, com todos os que viviam minha mesma história, a desventura e a esperança. Esses homens - nascidos ao começo da primeira guerra mundial, que tinham vinte anos à época em que se instaurou, ao mesmo tempo, o poder hitlerista e os primeiros processos revolucionários, e que para poder completar sua educação se viram enfrentados depois à guerra da Espanha, a segunda guerra mundial, o universo dos campos de concentração, a Europa da tortura e as prisões - se vêem obrigados a orientar seus filhos e suas obras num mundo ameaçado de destruição nuclear. Suponho que ninguém pretenderá pedir-lhes que sejam otimistas. Até que chego a pensar que devemos ser compreensivos, sem deixar de lutar contra eles, com o erro dos que, por um excesso de desespero, reivindicaram o
  3. direito e a desonra e se lançaram aos niilismos da época. Mas sucede que a maioria de nós, em meu país e no mundo inteiro, recusamos o niilismo e nos consagramos à conquista de uma legitimidade. Foi preciso forjar-se uma arte de viver para tempos catastróficos, a fim de nascer uma segunda vez e lutar depois, frente a frente, contra o instinto de morte que se agita em nossa história. Indubitavelmente, cada geração se crê destinada a refazer o mundo. A minha sabe, no entanto, que não poderia fazê-lo, mas sua tarefa é quiçá maior. Consiste em impedir que o mundo se desfaça. Herdeira de uma história corrompida na qual se misturam revoluções fracassadas, as técnicas enlouquecidas, os deuses mortos e as ideologias extenuadas; em que poderes medíocres, que podem destruir tudo, não sabem convencer; em que a inteligência se humilha até pôr- se ao serviço do ódio e da opressão, essa geração deveu, em si mesma e a seu arredor, restaurar, partindo de suas amargas inquietudes, um pouco do que constitui a dignidade de viver e de morrer. Ante um mundo ameaçado de desintegração, no que nossos grandes inquisidores arriscam estabelecer para sempre o império da morte, sabe que deveria, numa espécie de carreira louca contra o tempo, restaurar entre as nações uma paz que não seja a da servidão, reconciliar de novo o trabalho e a cultura e reconstruir com todos os homens uma nova Arca da aliança. Não é seguro que esta geração possa ao fim cumprir esse labor imenso, mas o verdadeiro é que, por todos os lados no mundo, tem já feita, e a mantém, sua dupla aposta em favor da verdade e da liberdade e que, chegado o momento, sabe morrer sem ódio por ela. É esta geração a que deve ser saudada e alentada onde queira que se acha e, sobretudo, onde se sacrifica. Nela, certo de vossa segura aprovação, quisesse eu declinar hoje a honra que acabais de fazer-me. Ao mesmo tempo, depois de expressar a nobreza do ofício de escrever, quereria eu situar ao escritor em seu verdadeiro lugar, sem outros títulos que os que compartilha com seus colegas de luta, vulnerável mas tenaz, injusto mas apaixonado de justiça, realizando sua obra sem vergonha nem orgulho, à vista de todos; atento sempre à dor e à beleza; consagrado, enfim, a tirar de seu ser complexo as criações que tenta levantar, obstinadamente, entre o movimento destruidor da história. Quem, depois desses, poderá esperar do presente soluções já feitas e belas lições de moral? A verdade é misteriosa, fugidia, e sempre há que tratar de conquistá-la. A
  4. liberdade é perigosa, tão dura de viver como exaltante. Devemos avançar para esses dois fins, penosa mas determinadamente, descontando por antecipado nossos desfalecimentos ao longo de tão dilatado caminho. Que escritor ousaria, em consciência, proclamar-se predicador de virtude?

domingo, 4 de julho de 2010

Criar, o próximo passo depois de amar

Não se extrai as pequenas certezas
apenas podemos aprender
como não sofrer sem liberdade

Sabedoria apenas por esforço e felicidade
E, de repente, ele apareceu, e no seu jeito de quem não tem plano nenhum, como se lhe faltasse as pequenas certezas, azeitamos um grande domingo em nossa história.
Fizemos um plágio com respeito ao strogonoff; de frango apimentado e sem cogumelo, misturamos à macarronada e arroz com água gelada. Lambemos os garfos e facas, feito dois machos alfa pensativos, porque o assunto oscilava nós e a revolução feminista, final da década de sessenta e início da de setenta, quando ele, em espírito, já estava em fase de acabamento.
Sei lá, eu lhe peço para imaginar tanto, sobrecarrego talvez com a suposta intenção de tornar o veículo de nosso devir, a vida, e não desembestar. Quando sei que bastaria voce acelerar, que obviamente me aceleraria da mesma forma, para a velocidade que precisamos agora, criando acorde por acorde, sentimento por sentimento, uma obra imortal, quem sabe.
Depois eu e ele assistimos Annie Hall, do Wood Allen, filme insuperável ao seu apoio à revolução feminina e mostra tudo que ainda exacerba e confunde a juventude, claro, principalmente a masculina. Exacerbação não é exagero, atenção, quando idolatrada, e no caso, masculina, até mulheres deixam de ser mulheres femininas, vide o motivo da ascensão nas pesquisas da Dama de Ferro Inglesa, para ganhar o segundo mandato. (Dilma, por todos, em vida!, não faça bobagens semelhantes.)
A masculinidade mal formulada tanto em homens quanto em mulheres, seja na política, ou na filosofia, ou mesmo em donadecasa é estupidamente desnecessária.
Daí a grande diferença entre dois conceitos, quase sempre tomados como iguais, feminina e feminista. Uma mulher que estende uma bandeira feminista, no dia a dia, adia a felicidade tanto quanto o homem que estende a bandeira macho. Até sapos tem seu gênero(?) macho. Enquanto homem e mulher não são gêneros, podem vir a ser, quando agrupados, mas em devir são tão somente indivíduos, que a qualquer instante podem e devem responder por si mesmo.

The Sounds Of Silence(tradução)

Olá escuridão, minha velha amiga
Eu vim para conversar com você novamente
Por causa de uma visão que se aproxima suavemente
Deixou suas sementes enquanto eu estava dormindo
E a visão que foi plantada em minha mente
Ainda permanece
Dentro do som do silêncio

Em sonhos sem descanso eu caminhei só
Em ruas estreitas de paralelepípedos
Sob a áurea de uma lamparina da rua
Virei minha gola para o frio e a umidade
Quando meus olhos foram esfaqueados pelo flash
De uma luz de néon
Que rachou a noite
E tocou o som do silêncio

E na luz nua eu enxerguei
Dez mil pessoas talvez mais
Pessoas conversando sem estar falando
Pessoas ouvindo sem estar escutando
Pessoas escrevendo canções
Que vozes jamais compartilharam
Ninguém desafiou
Perturbar o som do silêncio

"Tolos," digo eu, "vocês não sabem
O silêncio como um câncer cresce
Ouçam as palavras que eu posso lhes ensinar
Tomem meus braços que eu posso lhes estender"
Mas minhas palavras
Como silenciosas gotas de chuva caíram
E ecoaram no poço do silêncio

E as pessoas se reverenciaram e rezaram
Para o Deus de neon que elas criaram
E um sinal faiscou o seu aviso
Nas palavras que estavam se formando
E o sinal disse
"As palavras dos profetas
Estão escritas nas paredes do metrô
E na entrada dos edifícios
E sussurraram no som do silêncio"
(vagalume.com.br)

sexta-feira, 2 de julho de 2010

Inverno, uma preparação para a primavera

Matar ou desmatar
o que voce gosta, Caro Sobrevivente?

Ao meu filho, e às minhas questões de gosto, no que resta ainda de planeta sustentável

Não é questão de gosto
isso está fora de qualquer questão, sempre
porque qualquer dialética
se findaria na questão de vida ou morte, então
fadada ao fracasso total da civilização, quando
ou o mundo desapareceria ou
viveríamos finalmente o gozo infinito
e irremediavelmente irracional.

Muito se confunde a infundada questão de gosto com a dialética entre liberdade e necessidade, assim como com o determinado e o indeterminado, etc. Isto sempre ocorre talvez porque outra dialética fundamental também eternamente estará presente: o dito e o não dito. E, os especialistas em filosofia e ou em literatura, por gentileza!, tenham a calma providencial em vossos martelos; estou muito longe de querer a idolatria.
Entre meu particular e o mundo existe o mesmo caminho por onde todos, sem qualquer excessão, atravessam em duplo sentido. Vou sobrevoar, um pouco a antiguidade para os não especialistas entenderem; lembrando que nem sequer avião ou asas tenho.

"Heráclito (544-484 a.C.) nasceu em Éfeso, na Jônia (atual Turquia). Tal como seus contemporâneos pré socráticos, busca compreender a multiplicidade do real. Mas, ao contrário deles, não rejeita as contradições e quer aprender a realidade em sua mudança, no seu devir. Todas as coisas mudam sem cessar, e o que temos diante de nós em dado momento é diferente do que foi há pouco e do que será depois: "Nunca banhamos duas vezes no mesmo rio", pois na segunda vez não somos os mesmos, e também o rio mudou. Portanto não há ser estático, e o dinamismo pode bem ser representado pela metáfora do fogo, forma visível da instabilidade, símbolo da eterna agitação do devir, "o fogo eterno e vivo, que ora se acende ora se apaga".
Para Heráclito o ser é múltiplo. Não no sentido apenas de que existe a multiplicidade das coisas, mas de que o ser é múltiplo por estar constituído de oposições internas.
Parmênides (540-470 a.C.) viveu em Eléia, cidade do sul da Magna Grécia (atual Itália) e é o principal expoente da chamada escola eleática. Elaborou importantíssima teoria filosófica na medida em que influenciou de forma decisiva o pensamento ocidental. Ocupou-se longamente em criticar a filosofia heraclitiana: ao "tudo flui", contrapôs a imobilidade do ser. Para Parmênides é absurdo e impensável considerar que uma coisa pode ser e não ser ao mesmo temo. A contradição opõe o princípio segundo o qual "o ser é", e conclui, a partir do princípio estabelecido, que o ser é único, imutável, infinito e imóvel.
Não há, entretanto, como negar a existência do movimento no mundo que percebemos, onde as coisas nascem e morrem, mudam de lugar e se expõem em infinita multiplicidade. Para Parmênides, o movimento existe apenas no mundo sensível, e a percepção levada a efeito pelos sentidos é ilusória. Só o mundo inteligível é verdadeiro, pois está submetido ao princípio que chamamos de identidade e de não contradição.
Uma das conseqüências dessa teoria é a identidade entre o ser e o pensar. Ou seja, as coisas que existem fora de mim são idênticas ao meu pensamento, e o que eu não conseguir pensar não pode ser na realidade."
(FilosofandO - Introdução à Filosofia, Maria Lúcia de Arruda Aranha e Maria Helena Pires Martins, Editora Moderna)

Temos então um excelente material ilustrativo de como se originou o pensamento ocidental, e onde, sem sacanagem, podemos ver o quanto é risível um dos lados da questão, ora colocada, se fosse possível, da questão de gosto. Mas, óbvio que minha colocação pode fazer parecer tudo tão simples, pode causar desconfiança e gerar as mesmas confusões de sempre. Creio que o maior complicador em questão se deva à apropriação indébita do conceito de religião por pessoas que não estavam nem um pouco preocupadas com o destino da humanidade e do planeta, ou apenas preocupadas em si mesmas e aos seus próximos (de sangue). E isso nos remete diretamente a um tema caríssimo para mim, abordado aqui no blog com muita ênfase, a questão de Cain e Abel, mas porque os resultados foram exasperantes, não vou mais voltar ao assunto.

E gelado se faz o inverno
este que perdi mais que folhas em branco
no pior outono da minha vida.

quarta-feira, 30 de junho de 2010

Das vezes que eu preciso me cuidar

oh, criança que me dá trabalho

Voce sabe que eu jamais morreria de saudade
mas, do jeito que "a coisa vida" anda
estou pra morrer, ou, com sorte, perder o chão
então, meu amor, esqueça o bill
e me apareça outro pouco de tempo, vem, Dny

ps., faz tempo que meus inimigos
já não são mais as drogas;
agora são piores

terça-feira, 29 de junho de 2010

Etiológica e tal divina inveja humana

O menino beija a mais corajosa
e fica com as duas, se beijar a outra
também, perde as duas; elas*
são todas iguais

Não ser covarde é a pior desgraça do mundo, justamente porque a coragem se confunde com o tolo, porque quando em épocas de paz, se lhe der livre arbítrio, ou mesmo a menor atenção, o destemido prefere fazer o papel de bobo da corte a ficar resignado de boca aberta esperando a morte chegar, e, também, em épocas de guerra, repito, se lhe der livre arbítrio, prefere ficar para cuidar das famílias abandonadas. No primeiro caso, sofrerá toda sorte de gozação e consequente culpa por crimes que jamais cometeu e muitas vezes quem os cometeu, tinha justamente tal objetivo. No segundo caso, jamais poderá dormir tranquilo, porque estará sempre sob a ameaça de linchamento por deficientes físicos ou mentais, embora nem todos(as) covardes.
Na vida real, ou, rss, na vida fora do ambiente virtual, eu me comporto da mesma maneira e ganho a mesma fama de "ganancioso".
Talvez este seja o único motivo de eu não ter ninguém comigo realmente sem qualquer motivo bem aparente.
Um ganancioso jamais se satisfaz, tudo sempre se torna tão pouco.
Todo avanço da civilização se deu por causa de pessoas gananciosas.
Se chegarmos a povoar outras galáxias e encontrarmos outros planetas iguais a Terra, coitados dos alienígenas, pessoas exatamente como eu não vão pensar muito.
Não somos muitos, mas obviamente somos muitos perigosos.
Assim retomo a imagem de meu comportamento, agora exclusivamente aqui, no blog, reparem como estou bem acompanhado; quero toda "riqueza" da vida só para mim.
E toda essa riqueza está tão guardada que não possui a mínima possibilidade de partilha; só de pensar em dividir um cisquinho eu já me armo até os dentes.
E na vida real, rss, sou assim também, amarro minha riqueza com correntes, tranco-a a sete chaves.
Minha riqueza não é para ninguém; não dou, não empresto e não vendo por lero lero nenhum.
Não é que eu seja inseguro, imaturo, invejoso, covarde, etc., mas tão somente porque sou ganancioso.
Ganância é a minha realidade, e o resto - a minha vida, a minha mãe, o meu amor, meu conhecimento - é pura diversão, ficção banal, só poesia, que podem ser sacrificadas.

Raízes da ficção

"Nesta vida única e limitada que temos, a cada instante nos vemos obrigados a escolher um único caminho entre infinitos que se apresentam.
Eleger essa possibilidade é abandonar as outras ao nada.
Essa possibilidade que nem sequer sabemos até aonde vai nos levar, pois nossa visão do futuro é precária e sentimos o mesmo desassossego que o navegante que precisa passar entre escolhos perigosíssimos em meio à névoa e a escuridão.
Temos certeza apenas que mais adiante está a inevitável morte, o que precisamente torna mais angustiante nossa escolha, pois faz dela algo único e inevitável.
Escolha, portanto, que parece inventada pelo demônio para nos atormentar, pórtico, como presumimos, de uma quase certa frustração, o caminho da desilusão e do fracasso. E, para maior escárnio, por causa de nossa própria vontade.
Na ficção, ensaiamos outros caminhos, lançando ao mundo personagens que parecem de carne e osso, mas que pertencem somente ao universo dos fantasmas. Entes que realizam por nós, e, de algum modo, em nós, destinos que a vida única nos vedou.
O romance, concreto mas irreal, é a forma que o homem inventou para escapar desse encurralamento.
Forma tão precária como o sonho, mas, ao menos, mais voluntariosa."
(Ernesto Sabato, O escritor e seus fantasmas, Companhia Das Letras)

segunda-feira, 28 de junho de 2010

Nem filósofo, nem escritor; tão somente sangrando

Diversas vezes, apenas a imagem do esforço
basta para suscitar algo que não justifica
toda forma de eternidade

PUREZA, ETERNIDADE E RAZÃO

"Somos imperfeitos, nosso corpo é frágil, a carne é mortal e corruptível. Mas, por isso mesmo, aspiramos a algo que não tenha essa desgraçada precariedade: a algum gênero de beleza que seja perfeita, a um conhecimento que valha para sempre e para todos, a princípios éticos que seja absolutos.
Ao erguer-se sobre as duas patas traseiras, este estranho animal abandona para sempre a felicidade zoológica e inaugura a infelicidade metafísica que resulta de sua dualidade: fome desmedida de eternidade e um corpo miserável e mortal.
Então começa as perguntas: existe algo eterno além deste mundo transitório e em perpétua mudança?
E se existe, como podemos alcançá-lo, mediante qual intermediário, graças a que fórmula mágica?
No ocidente, os gregos já se colocavam esse problema e encontraram a solução nas matemáticas. Claro: até as poderosas pirâmides faraônicas, erguidas com o sangue e as lágrimas de milhares de escravos, são apenas pálidos simulacros da eternidade, destruídas finalmente pelos furacões e as areias do deserto; mas a etérea pirâmide matemática que é seu modelo permanece imune aos poderes destrutivos do tempo. E se esta paisagem que temos diante de nossos olhares se apresenta com cores mutáveis, conforme a hora e o lugar de onde a contemplamos; se tudo o que entra por nosso sentidos é mutável e sujeito à discussão, está tingido por nossos estados de ânimos e deformado por nossas paixões, é relativo e radicalmente subjetivo; ao contrário, este teorema que demonstramos vale para todos, aqui na Grécia ou lá na Pérsia, faça-se sua demonstração em nossa língua ou qualquer outro idioma real ou inventado, estejamos possuídos pelo furor ou sejamos indiferentes a essa verdade ou a qualquer verdade.
Desde Pitágoras, os gregos observaram esse fato extraordinário, assombroso tão logo se pense um pouco, e concluíram naturalmente que a matemática indicava a rota secreta que, através da selva escura de nossas sensações, tendo por guia apenas a razão, com a única ajuda do pensamento puro, nos conduzia ao universo eterno da verdadeira realidade, a partir deste mundo confuso que suscitava o ceticismo de Heráclito.
Assim surgiu no povo helênico o prestígio do pensamento como instrumento do conhecimento e este divino prestígio perduraria no Ocidente ao longo de quase mil e quinhentos anos de guerras, invasões, derrocadas e devastações.
Até que filósofos que parecem fazer literatura e escritores que parecem filosofar o negaram."
(Ernesto Sabato, O escritor e seus fantasmas, Companhia das Letras)


Existo, e este termo está ficando cada vez mais "caro"

Existe muita diferença
entre o peito estufado
coração no bolso
com o peito aberto
coração na mão
continuar seguindo
e sangrando

Existe verdadeiras dores
diferenças dessa vida
para continuar escrevendo
apesar da língua suja
grave e embargada
pelo dito não dito

Existe e sabemos
existe eternamente
precisa existir qualquer coisa
e quando somos qualquer dessas coisas
queremos mais, ou menos
ou deixamos tudo como está
ou, claro, eu, já estou pensando
na próxima "derrota";
a nestes dias foi "só"
a morte de minha mãe

E então de repente ficou tão desnecessário, muito mais do que antes, escrever versos ou em versos, seja qualquer coisa, ou coisa nenhuma, de qualquer jeito, ou de jeito nenhum, ficou ainda mais sem qualquer importância existir, viver ou morrer, já que isso, ser ou nada, tornou-se quase o mesmo inexequível orgasmo da existência.
Ela amava o Gonzagão, amava o filho, e toda vez que perguntávamos qual era a música mais bonita do mundo, ela respondia Asa Branca, e a música mais bonita da vida, ela respondia 'aquela do filho do Luis Gonzaga, aquele que dizia que tava sangrando..." Ela adorava também a Elis, e via seu sofrimento, mas nunca soube explicar, e nós insistíamos, mãe qual é o sofrimento dela?, e respondia que como podia saber?, nunca tive estudos, se voces não sabem... Nós insistíamos, tenta explicar, ela tentava, dizia que a Elis sofre assim como voces, e nós calávamos, porque tudo sempre se tornava tão "sem sentido".
Ela amava o Rolando Boldrin, a pujança da Inezita Barroso, a coragem e safadeza da Dercy Gonsalves, sempre foi apaixonada pelos Irmãos Coragem, não entendia como podíamos gostar da Saramandaia, e ria com o jeito tão esperto do José Wilquer, a Regina Duarte e a Glória Menezes eram o maior exemplo de mulheres bonitas.
Jamais esqueceu os filmes do Mazaropi, bastava poder contar alguns que já ficava alegre e, nunca sabíamos porque, sempre, acabava lembrando do Lampião, que certa vez passou lá no lugar onde crescia, quando ainda criança, morreu de medo, e depois perdeu o medo assim que teve um mínimo de noção política.
Lembro que alguns dias antes de começar perder a lucidez, disse-me que precisaríamos, eu e ela, arranjar um tempinho para contar sua vida.
Lembro, nestes mais ou menos trinta sessenta dias, muita coisa, muitos projetos e sonhos.
Queria enfim ter um carrinho próprio para poder visitar os sobrinhos em Jundiaí, o irmão em Marília, a Vilma e a Beth, aqui mesmo na capital, na hora que desse na telha, que podia rever o mar, pela segunda vez, e ir até o supermecado a qualquer hora, não acreditava que tinha supermecado aberto de madrugada.
Eu sou difícil para chorar, mas preciso parar de lembrar escrevendo, essa coisa é muito real e essa realidade está cada vez mais foda.

sábado, 26 de junho de 2010

Deus esquartejado não serve de alimento

"Há dois modos de pensar:
aquele que concebe a existência
das coisas fora do espírito
- as idéias -
e aquele que não representa
nada fora de si mesmo
- as imagens enquanto afecções
de nosso corpo na relação com outros"
(Marilena Chauí, sobre Espinosa, no livro
Da realidade sem mistérios
ao mistério do mundo)

Pode parecer muito estranho, quando se encontra pessoas que lêem muito, se comportando como se nunca houvesse lido porra nenhuma.
O maior indicativo desta surpreendente contradição é o tempo atual, onde o maior, ou talvez o único problema que a ciência está realmente impotente para solucionar é a superpopulação do planeta. E, exatamente onde aquele estranhamento se torna tão semelhante a qualquer paradoxo original, jamais a ciência, enquanto já categoria do conhecimento, também não é capaz de se ver livre da leitura, do registro, do fundamento da história, enfim, do livro.
Qual é a causa desta impotência atual? O que causa esta simulação de ocultar um embasamento histórico no dia a dia coloquial?
Entendam como queiram, mas estas questões são essenciais para salvar o planeta.
Quem quiser compartilhar, sem repetir mais das mesmas atitudes paliativas e ou capciosas, tanto ecológicas quantos filoantropossociológicas, sejam benvindos.
Não é uma conversa de bar, claro, mas o clima pode ser o mesmo.

Vamos pedir piedade, Senhor
Piedade, para essa gente
Careta e covarde


Era uma vez um anjo

E o menino nasceu, e logo queria mais
E ele então crescia, e mais queria
E se tornou jovem, e queria ver envolta
E se fez adulto e quis ensinar

E amar, e sonhar, e assim queria mais viver
E portanto conseguiu morrer, mas não bastava
E quer ser lembrado, e assim querendo os outros
E não satisfeito, quer ainda o impossível

E o menino está esquecido, e ainda quer mais
E quererá sempre, que atirem a última pedra
E amará outras vezes mais o fim das invejas
E sonhará que Lhe devolvam cada pedaço

terça-feira, 22 de junho de 2010

A mão de Deus

“ou a humanidade renuncia à violência
da lei de talião,
ou a pretendida práxis política radical
renova o terror do passado”. Adorno

De como a mais valia se tornou apenas mais prazer

Fred F não é um robô, mas trabalhando sempre parece assim. Ele não trabalha só, faz arte, então tem como objetivo o mundo e sabe que, nesse momento, não é o seu próprio mundo. O mundo de Fred F há muito tempo se perdeu, e agora só pode ouvir algumas notícias dele quando perde tempo divagando por galerias de arte, quando enfrenta aborrecimentos e mínimas doses de encanto durante saraus cada vez mais barulhentos, e quando vai ao cinema por acaso, sem escolher os filmes ou apenas para dormir, mesmo que jamais consiga, ou então, isso ele tenta esconder de todo mundo, quando, nos restaurantes onde almoça e janta, pede ás vezes um pouquinho de orégano para fumar. Sua vida portanto se tornou dividida entre estes dois mundos, o objetivo e o relapso. Entre prêmios por produção e condenações sem crimes cometidos.
Fred F envelhece por minuto e agradece a cada segundo por não sofrer dores físicas. Nunca se cansa porque jamais sente seus movimentos. Tanto em seu mundo quanto no mundo que também pertence aos outros. Nunca mais soube se é qualquer coisa ou se está em qualquer lugar, não sabe se realmente sente mais qualquer sensação além daquelas que nunca pode evitar.
Na última vez que recebeu notícias do que ainda pode lembrar o que é ou foi o seu mundo, Fred F encontrou algo que se diz lembrança ao tropeçar em uma mão e, por gentileza, ao tentar se desculpar, assustou-se; era uma mão abandonada, sem ninguém, atravessada no caminho, ainda quente. Ele a tocou e os seus minúsculos pelos se arrepiaram.
Fred F, paralisado, sem saber se de terror ou prazer, porque há muito tempo nem mais sabia de tais existências, e também sem saber se de dentro ou de fora daquele momento, escutou uma voz dizer: "tome cuidado com a mão de Deus".
Ele correu, correu muito rápido, assustado, chamando a atenção daquelas pessoas sentadas, ou deitadas, ou andando à deriva pelas ruas, visivelmente alucinadas por ingerirem produtos que dão o nome de droga, estava atrasado para tomar o último ônibus, se perdeu, passou várias vezes pelos mesmos alucinados, por vielas e bocas sujas, até que avistou seu ônibus partindo, entrou na frente, o motorista foi gentil, parou e abriu a porta. Mas Fred F não subiu a escada do ônibus, lembrou da mão de Deus e se arrependeu. Ele sempre foi muito religioso.
Fred F voltou tão rápido quanto pôde, evitando a todo custo fazer o que dizem o que é pensar, e, assim que percebeu a mão de Deus no mesmo lugar atravessada no caminho, teve a melhor notícia de todos os tempos do seu mundo. Imediatamente retirou o lenço que ganhara de seu pai e, tomando a mão de Deus ao colo, começou a limpá-la e beijá-la e apertá-la com muita força e carinho e tão forte foi sua recuperada capacidade de sentir que uma torrente de lágrimas cristalinas escorreu por sua face.
O mundo de Fred F o adormeceu abraçado à mão de Deus. O sol já raiando, o movimento frenético da cidade aumentando, a mesma voz de antes o acordou: "Devolva-me a mão." De repente sentiu um forte cutucão nas costas, era o mundo que também pertence aos outros, paus em riste e uma voz que jamais viria de dentro dele: "Levanta daí, lixo humano, se não quiser morrer."



domingo, 20 de junho de 2010

Nenhum preço é transparente

A vida é uma doença
sexualmente transmissível,
que tem cem por cento de taxa de mortalidade
(R. D. Laing)

Talvez se eu aproveitasse minha experiência de vida para escrever contos de fadas originais, não me faltasse, nestes dias atormentados pelo por do sol da vida de minha mãe, um liquidificador para preparar melhor sua dieta alimentar.
Tão logo, meus amigos e parentes, vão questionar e encontrar razões lógicas para o fato do liquidificador estar quebrado.
Com toda certeza nenhum deles quererão saber por que de fato o liquidificador está quebrado, e se eu lhes perguntar, por exemplo: Querem saber...? Com toda certeza, matematicamente é óbvio, nenhum deles vão sequer disfarçar que não ouviram a pergunta.
E, muita atenção nesse detalhe, se eu comprar um liquidificador novo, todos vão me chamar de marajá, de bacana, ou inquirirão: Vejo que está sobrando?
A vida é mesmo um teatro. Felizmente a peça possui inúmeras variantes, o suficiente para qualquer pessoa não morrer de tédio.
Enquanto isso, o verdadeiro problema da minha vida, com ou sem criatividade genial, não é tão somente a falta do liquidificador, e muito menos o por do sol da vida minha mãe. Mas não sei se devo escrever aqui, ou se devo escrever codificado em poesia, conto, crônica, etc, enfim, expressar-me em qualquer gênero, e tampouco sei se quero ser escritor, pensador, artista, ou qualquer coisa especialmente identificável, porque na experiência todo ser não passa mesmo de uma quimera, principalmente nos tempos de hoje, é difícil acreditar que alguém consiga superar o monstro imaginário que somos.
Fadas e elfos, no mundo imaginado, e pessoas inexoravelmente comuns na experiência mais particular. Talvez possa haver ainda um terceiro campo de atuação inerente ao ser, um lugar muito íntimo, tão pessoal e solitário, que mesmo transparecendo sutilmente em pequenos desequilíbrios afetivos, jamais poderemos, por natureza, ter certeza que exista. Sequer sabemos se este canto recluso de cada si mesmo é natural ou simplesmente mais uma neurose, ou facetas multimercadológicas.