segunda-feira, 10 de maio de 2010

O oco de fora

Henry Darger (1892-1972)
A primeira intenção é a que fica

Estranhas manias de Henry Darger

"É da fachada que se baste por si mesma
à medida que lhe é próprio ser suficiente aos olhos.
A estética da fachada que defende o muro branco
é a mesma que sustenta a plastificação dos rostos,
a ostentação dos luxos no "aparecimento geral"
da cultura espetacular, no histérico "dar-se a ver"
que produz efeitos catastróficos em uma sociedade
inconsciente de seus próprios processos."
(Marcia Tiburi)

Toda "questão é bem mais séria do que a sustentação de uma aparência
ou de um padrão do gosto".

PiXar,
assim escrito,
é alcançar a pele
e revelá-la incolor,
ou com tinta de livre cor,
traços de signos sobre a luz,
fartura e fratura sem sobras
sem faturas nem futuras de amor,
é a poesia para nunca mais se fechar
ao leitor, qualquer ziper moral sobre a boca
ou o sexo, é a filosofia nem tanto para anjos nem
para demônios. Mas o X da questão, a pichação para
todas as questões: Como deter o aumento demográfico do planeta
sem o assassinato?

"Ler o que essa treva revela,
Revelar o que essa era oculta.
Sinais de luta, além da tela.
Reler o que, ao se escrever, revela.
E sua pena atenua e libera."
(Rodrigo Garcia Lopes)

Um dicionário miúdo ao lado,
uma zona de livros proibidos ao público veloz,
o infeliz vício ao masso e cinzas e cartuchos vazios,
minha face mais honesta em foto colada ao monitor. E eu,
o que não posso ver senão em reflexo. O pensamento preso
na imaginação e no movente devir sobre sua imagem, visitas.

O voo de osa poderosa
"Tudo depende de nós, se vamos bem ou mal, se trabalhamos mais ganhamos mais.
Eu não sabia nada disso, como se imprime, cola, pinta.
Tudo é uma experiência, vamos aprendendo.
São seis anos de cartoneria, mas ainda vamos aprendendo dia após dia.
O importante é que se faz o que se gosta,
independentemente de patrão,
do massacre que é esse sistema capitalista neoliberal."
(Cucurto)

A burguesia usa perfume, muitos ainda à moda francesa, poucos já usam o banho em praça pública. Três situações ilustram uma única cena, o menino de rua, que valoriza sapatos, observa um par muito elegante, dentro um senhor, jornal, café da manhã, café de máquina e pãozinhos amarelinhos de queijo, pernas cruzadas sob a mesinha minúscula como se fosse brinquedo de época, o menino de fome pede um pãozinho, dentro o senhor olhando o menino pode responder, 1 balançando o dedo em negativa, 2 vestir o chapéu, dar os quatro pãozinhos de resto, levantar sem sorver o último gole, dar uma olhadinha para trás antes de pagar. e 3 comprar mais 100gr no saquinho mais gostoso que pão.

Eu acredito só nas músicas
"Eu aguento até os caretas

E suas verdades perfeitas
O que eu não gosto é do bom gosto
Eu não gosto de bom senso
Eu não gosto dos bons modos
Não gosto"
(Adriana Calcanhoto)

Sem palavras
"eu, no entanto
que não sou sábio de nenhuma espécie
e estou mais que soterrado
convenci-me da existência
de outra espécie de silêncio
mais raro e singelo
chamo-o silêncio sem hematomas
e é isso
ou o berro na cara"
(Luiz Felipe Leprevost)


Jamais aproveitei corretamente minhas aulas do fundamental, a professora de letras, linda, um tesão, substituta, pede para ler Macabéia, da Clarice. Ela me empresta porque faço cara de quem não precisa ler para saber o destino de Macabéias. Ela diz que é fundamental ler para se ter um espelho perfeito. Pego livro e leio até de madrugada. Acordo com a Macabéia no coração. Pergunto, o que faz aí? Ela responde, sei lá, o senhor é maluco?, é um pervertido?, é um cachorro?!!, por que me colocar aqui neste coração horrível? Respondo, ora, coração igual a maioria dos brasileiros, voce não é brasileira?, então, Macabéia tem coração igual ao meu. Ela grita na minha cara, igual ao seu nem morta, vem não, sou muita mulher e não sou granfina, não. Eu procuro compreender, fecho minha jaqueta surrada, e vou prá escola. Macabéia socando meu peito, deixa eu sair daqui, voce vai ver, eu mesma vou lhe por no colo e bater de cinta. Duvido, deixa minha mãe saber.

Uma estética imaculada

"Em vez do gesto auto-contente, o que a pixação revela é a irrupção de uma lírica anormal.
A Internet com seus blogs (horrendos, bonitos, mais bem feitos ou mais mau-humorados) é o seu análogo perfeito.
A pixação revela o desejo da publicação que manifesta a cidade como uma grande mídia em que a edição se dá como transgressão e reedição onde o pichador é o único a buscar, para além das meras possibilidades de informar ou comunicar, a verdade atual da poesia, aquela que revela a destruição da beleza, o espasmo, a irregularidade, a afronta, que não foi promovida pela pixação, mas que ela dá a ver.
Em sua existência convulsa a pixação é a única lírica que nos resta."
(Marcia Tiburi)

12 comentários:

Douglas Vieira disse...

Assassinato!

Grande Devir, tenho matado muitas coisas. Nem sei se ainda vivo.

Mas eu posso garantir - te que, mais ainda tenho pixado e pichado situações e ocorrências dentro de mim. Fazendo com que eu insista em viver.


"103 anos é para sempre, quando se é apenas uma criança"
(Dave Matthews)

Devir disse...

Impressionante!
Antes da arte, seja ela a porra que for
o artista precisa
Ser
Aparecer
e, claro, arregaçar as mangas;
não enfeitar por cima
nem criticar para debaixo do tapete.

Vamos nessa!

Ae, já mandei convite para o Affonso Romano de Santanna.

Devir disse...

Tenho pensado bastante
em assassinos e assassinatos
e descobri que se assassina
nomes e sonhos com igual facilidade
mas o corpo...

Parece que foi criado Só
pra fuder

morre quando quiser
e é Só mesmo
forçar contra sua vontade
ou basta Só
pensar
para que ninguém Só
saiba a razão deste viver
Só viver

Mas, rss, outra coisa
menos lírica quando não se sabe
menos fresca, o corpo
não sabe estar lado a lado
sempre ou por cima ou por baixo
e claro de frente ou de trás
com as coisas das línguas
com as consequências dos signos
com as confusões das metáforas

Se o corpo vai na frente
não espera e nem arrasta
se vai atrás ó merda
se perde e ainda se quer arrastado

Finalizando, o corpo
quando está lado a lado
não é corpo
é frescura
que se traduz por tabú

Luciano Fraga disse...

Caro amigo Devir,pixar, já tive vontade...Foucault:existe na sociedade os princípios de "exclusão e interdição".Sabe-se bem que não se tem o direito de "dizer tudo, que não se pode falar de tudo, em qualquer circunstância, enfim, que qualquer um não pode falar de qualquer coisa".Outro princípio de exclusão seria a oposição, razão e loucura.Assim nos muros, as palavras dos loucos não está submetida à separação,exclusão, tornando-se nula como já foi e ainda é em certos meios.Forte abraço.

Estamos começando a trabalhar a próxima Voz.Pessoas tem-se manifestado, esperamos as críticas.

Devir disse...

Pois é, Luciano, na Dinamarca, sempre existe algo que não se manifesta, porém quando um dinamarques rabisca o avesso de uma prova, seja na infância, seja no "vestibular", não precisa tomar cuidado, porque mesmo que não entra na nota, as autoridades de ensino, lá, observam atentamente as críticas nas metalinguagens. (Eu li isso em algum lugar)

Acho que voce não entendeu o post, mas apenas isso é muito normal. Posso estar enganado, além do óbvio de sempre, a sindrome da existência dos patinhos feios, que por insistência, há tempo já percebi, neste domentário, voce dá à mostra algo um pouco mais vil.

Quanto a Foucault, leia um pouco mais além, porque, quando anuncia as formas de interdição e exclusão, procedimentos ditos necessários para a organização social, deixa as arestas fundamentais para dialetizar com os fatos, com as instituições, etc.

Não percebo dialética no seu falar.

[falar é fazer alguma coisa — algo diferente de exprimir o que se pensa, de traduzir o que se sabe e, também, de colocar em ação as estruturas de uma língua; mostrar que somar um enunciado a uma série preexistente de enunciados é fazer um gesto complicado e custoso que implica condições] (Foucault)

Adriana Godoy disse...

Confesso que fiquei meio perdida nessas elocubrações todas. Mas é assim mesmo. Uma hora eu encontro o caminho. Pixar ou Pichar, eis a questão! bj

Devir disse...

É isso aí, AGod, sobre sua sinceridade pessoal, não preciso de palavras.
Toda sinceridade(geral), paguemos o preço que for, sempre vale porque significa a vontade da verdade.
Verdade é um conceito absoluto, portanto inquestionável.
E, nessas palavras, existe o maior dos perigos - farei uma analogia ao Sol - quanto mais próximo para conhecer, mais quente vai ficando, até o ponto que todos os absolutos perdem a importância.
Quando um absoluto nega o acontecimento do outro, ambos deixam de existir. O que existiam, não era vida, era tão somente fixação e promessa.
Na mitologia grega, fixação e promessa, representa Pandora e Ícaro, politicamente o Poder e a Desobediência, estupidamente o maculino e o feminino, etc......

Mas é muito chato isso, falar falar falar, e não ter voce! em companhia, neste finde em Sampa.

Beijo

Luciano Fraga disse...

Caro amigo Devir,já havia manifestado num coment anterior, da(s) possibildade(S) de equívocos interpretativos nesse ou naquele texto, mas acho isto fantástico no processo comunicativo, a forma como o outro entendeu, se certo ou errado, se assim ou assado, ou da maneira que esperávamos,não tenho preocupações dietéticas quando assim o faço, afinal nossos blogs não tem regulamentos com aquelas tradicionais alíneas que estragam a beleza e a naturalidade das cores e manifestações(rss).Certamente interpretei errado, interpretarei e fui interpretado desta forma.Mas seguirei falando,com leveza e sem vileza, forte abraço.

Devir disse...

Acho, que por momento, encarei como uma censura, já que havia escritos algumas coisas um tanto "porno", mesmo de sutil metáforas, lá no seu espaço. Então, claro, as condições era de liberdade, embora sei que esta é mais responsabilidade, do que falta de respeito.
Espero que isto serviu para melhores dias que virão, ok?

Assisti hoje um filme muito interessante, título em portugues, A Fúria. Assista, creio que ilustra muito bem, o qual de muitos, é o maior problema de minha vida.
E, esse saco, enfim já encheu, e não quero, não posso, vou fazer tudo para não estourar.

Forte abraço

Devir disse...

Vou fazer de conta que de ontem para hoje, voce foi ali e arrumou o dvd e assistiu o filme.

Então, agora já sabe a minha dificuldade na convivência regular, quando só jogo de cintura não refresca no verão, quando só o sexo não aquece no inverno, quando só a esperança não anima ao ver as folhas caindo e quando só o jardim doméstico não satisfaz o perfume da vida.

Infelizmente ouso sempre, desde que nasci, a querer mais que a abundância e dispor menos que o nada, e, ao mesmo tempo que incorro na soberba e na cobiça, também sofro a confusão da avareza e da melancolia.
Mas procuro não me deixar levar pelos julgamentos superficiais dos outros, que então também me classificam de acidioso e orgulhoso.
Ao tentar fugir dessa estrutura que jamais me convidam para repensa-la, escorrego sempre e caio na mais pastosa vaidade e me tomo da mais absurda ira para não me afogar, onde nadar é inócuo.
E se, pensando, não evito tais obcenidades morais na sociedade, doravante aprecio momentos quando a razão não existe e a fuga realmente se realiza; jogo-me de corpo sem alma nas mais arriscadas luxúrias, quase sempre mui bem acompanhadas por uma desonesta gula.

Tudo isso e ainda não cometi nenhum crime contra a pessoa, sequer por debaixo dos panos.

Do filme para a realidade, agora a pouco estava enfim vendo as fotos do lançamento do Voz e, porra, por quê não bebi também aquela cervejinha e não ri muito com aquela galera.
Porra, que vale a poesia, a sabedoria, arte e pensamento em geral, se não podemos rir e molhar a boca junto dos semelhantes?
Dê um forte abraço a cada um por mim, Luciano.

Douglas Vieira disse...

Agora posso dizer que entendi.
Porra! Só agora?
Quão atrasada é minha disposição.

Grande Devir, poderia a vileza de algumas palavras, tornar vil todo um escrito?

Antes mesmo dos nomes, a primeira intenção é a que fica.


Abraço fraterno.

Devir disse...

Grande é a pessoa que possa entender o quanto para ela é o não a despertar os próprios desejos.

Douglas, parece que voce é um tipo de homem - tipo sociológico/biológico, o grande esforço de adaptação dos instintos às regras da realidade determinada - que pouco apareceram, desde a infancia, para que eu tivesse uma base de conhecimento - ação/reação e, literariamente, tese, antítese e o devir das sínteses.

Existem, creio, até onde pude estudar a convivência, duas supostas instâncias de onde partem as intenções, dessas então as percepções, e por fim as escolhas para compor o próprio devir, e são elas geralmente em forma de paradoxo, INverbalizável, qual a criação do "universo", que tentarei fazer entender assim, 1 o desejo de se somar a tal universo, exclusivamente cultural, e 2 a fome de se servir do tal, exclusivamente corporal.

Este assunto é muito discutido, queria 0.1% da grana que só Sampa gastou de ontem para hoje com cerveja; imagine 3.000 espetáculos de graça em 48 horas, em uma geografia que se pode percorrer a pé, trocando idéias.

A cultura é o devir humano, o corpo é o devir da natureza. Não nos separamos do Outro, assim como não nos separamos da pedra. E, quem sou eu para apontar um hediondo erro na civilização?

No post posterior é possível vislumbrar este inexpugnável gesto para a posteridade.

Vamos nessa, forte abraço.