
Lixo especial: perfuro contaminante!
Minha mãe chegou assim: Filho, filho, liga pro Lino, liga. Nós estávamos na calçada tomando sol, ela sentada na cadeira branca de plástico e eu naquele bloco de granito rosa gerais. Fui logo dizendo, Mãe, nós ainda não viramos pedintes. Ela ficou calada por vinte minutos olhando um ponto no cimento onde via talvez dentro de si o câncer, sua matriz no pulmão, com filiais no fígado e no cérebro, levando essa sua vida e que se acaba como pedinte. Minha mãe repete, liga pra ele, liga.
Eu olho o dia, o país e os brasileiros, talvez não consigo olhar para ela, pego o celular, agenda, passo.
Neste momento entendo, estou fazendo hora extra na vida. Já nasci assim.
Minha mãe me passa o aparelho, meu irmão me pergunta pelo dinheiro da aposentadoria dela como se eu tivesse fumado o dinheiro, o pulmão, o fígado, o cérebro da minha mãe. "Como se não me bastasse fumar quantos rins deste filho da puta." E o filho da puta não vai dar, mas vai morrer por isso, e eu quero ver esse cara secar, tomara que toda família morra e ele não. Ele vai morrer só depois que a família toda se for, e vai ver cada um, vai estar no enterro da ultima, e eu serei o último antes dela, e quero lhe perguntar, ah vou, antes de morrer, só nos segundos finais quero me redimir, nem mais um tempo mais, exatamente como ele, tempo custa dinheiro, vou perguntar: "Cadê a chave?" Só para fudê-lo, até no último instante. Ou perguntarei desde já: "Voce acreditou?"
Eu, olhos para minhas mãos, a pele se soltando dos dedos, as unhas pálidas... Não há nada, não há mais nada, para pensar.
Minha mãe estende o braço, eu a levanto e vamos andar quatrocentos metros, duzentos na ida e mais duzentos na volta.
A televisão adoraria filmar, eu e minha mãe passando pelo portão, outra câmera no fundo, nossas costas e a platéia. Dois dos novos aparelhos de segurança nacional à nossas costas. Olho para trás, nas costas deles vejo meu irmão, sem batina, orando em nome de Deus, socando o ar, sai daqui satanás, sai dessa casa satanás, vai satanás, volta, pro seus quintos dos infernos, causando frisson, na janela do prédio, no primeiro andar, a sobrinha do sacerdote na Índia, ameaçando se matar. A Rita, a professora de Biologia sorri para mim, como se soubesse que isto é mais uma das minhas poesias. Meu irmão mais novo e minha cunhada mais sonsa chegaram a tempo, por coincidência estavam bem humorados e até tentam me cumprimentar, ela com aquele beijinho de pescoço pele de pescoço e ele com aquela mãosinha sem temperatura. Os cachorros se trepando a todo canto, perto da pracinha uma multidão, uma ou duas mãosinhas estendidas para chamar a atenção das câmaras, oi, oi, estou aqui. O caminhão das Casas Bahia que jamais quebrou, achou de quebrar no meio das filmagens, o técnico de manutenção discutindo com o motorista, a grua enroscada no baú. Um play boy ouvindo Lady Ga Ga me incomodando porque eu gosto mesmo é das mulheres de verdade. E que se dane a teoria, essa é a teoria, estou algemado mas estou ganhando muito, não só dinheiro, estou ganhando também fama, pensam que vou sofrer em um presídio de merda. Que babacas, meus irmãos pensam que vou virar mulher, vou servir peão, além de dar o cú, terei que ser mulher ou brocha, eles pensam, todo mundo, exceto os deficientes, pensam.
É a grande primeira reportagem da nova iniciativa do jornalismo brasileiro, a Moniquinha da Globo, somente com ela que eu falo, "Por que voce a escolheu?", digo qualquer asneira mas somente para ela, "Mas, somos do comitê, não somos apenas jornalistas", eu sei e entendo o que esta acontecendo aqui. " E como voce se sente, agora, neste momento, assim tão famoso, rico e rodeado de sucexo, ops, perdão", com certeza está acontecendo uma partida maravilhosa, sabem que meu sobrenome é Santos, então, "E o que voce pensa ao se tornar o homem do ano?" como eu me sinto, bem, vou dizer, bem, "Aquele seu projeto de juntar o núcleo do átomo para criar uma bomba atômica está emperrado, vai ser só um livro, ou é mais um daqueles projetos de mídia, que acabam virando fantasmas, os filhos recolhem os mortos e feridos, nada se traduz em simbologia entre uma e outra geração", qual é o seu nome? "Agora, voce importa?", nosssa, descupa e, rss, está todo mundo penssando que é festa ser mau, "Ai".