sexta-feira, 16 de abril de 2010

Criaturas sem leituras


A pensar que todo esse tempo, eu tive esperança
mesmo sem apreciar sequer uma substância realmente cara
talvez até mesmo sem apreciar nada além da substância em si
formigas e mosquitos, inúmeros em si e eu verossimilhante, rss

SOMA ZERO
"Sei que temos esse jantar, não se preocupe, estou vendo se encontro aquele vestido... Vou a outras lojas, depois... Tchau."
A mulher desliga o celular, voltam a se abraçar na cama, esquecem a vida.
"Esse coração batendo forte é o meu ou o seu?"
"O nosso, o suor também é nosso, mas esses fios de cabelo na sua mão são meus."
Silêncio.
"Não fica olhando para o teto, olha para mim."
O homem olha para a mulher.
"Estou muito feliz. Sabe quanto tempo vou ficar feliz?"
Silêncio.
"Até entrar no meu carro e chegar em casa. Às vezes tenho vontade de me drogar, mas sou muito medrosa para fazer isso."
"Não ia resolver nada."
"Quando cheguei em casa ontem ele perguntou, Voce foi ao cabeleireiro para fazer um penteado desses? Inventei uma resposta... Estou andando sobre carvões em brasa... Voce não entende, voce sai de casa e bate a porta, eu tenho que deixar instruções com empregadas, dar explicações, criar cenários, dizer mentiras, e na volta tudo se repete, novas determinações, providências, desempenhos, embustes. O lar é um monstro que nunca tem suas exigências saciadas, está sempre pedindo mais.. À noite tenho que ir a festas e jantares com ele e os nossos amigos, onde me mostro alegre, e sou a que ri mais alto, a que fala com mais entusiasmo, mas quando chego em casa estou com vontade de vomitar e preciso tomar um tranquilizante para poder dormir."
"Eu te amo."
"Não precisa fazer essa cara de cachorro sem dono, esquece o que eu disse."
Ela o beija. Fodem novamente.
"Voce puxa meus cabelos com força. Voce é sádico e maluco. Um pouco sádico e muito maluco."
"É sem querer."
(...)
Conto do livro Pequenas Criaturas, 2002.

Pois bem, a realidade é essa?
é uma ferramenta para validar sua existência?
ninguém a fez assim, justamente para esse propósito, já estava assim determinado?
e a minha existência?
e a sua, para que serve?
ao quê e a quem servem, conviver, eu, voce, outros?
e quanto podemos usar tal ferramenta?
poderia dar vida espetacular a uma violoncelista?
ou só imagem?
poderia impedir o envelhecimento de minha mãe?
ou só assistir?
poderia encontrar sentido ao devir?
ou só inexistir?

2 comentários:

Mariana Abi Asli disse...

A vida é uma bobagem, uma porcaria tão grande, um absurdo tão medonho, uma pilhéria tão grotesca, uma imposição tão vigorosa, que não resta escolha: o suicídio ou a ilusão.
Rs, Ilusão que nos afaga??
bjs doces

Devir disse...

Um ninho de mafagafos!
Preciso de (alguém), não posso sobreviver limpo
sem alguém do meu lado.
Desde semana passada, conzinhando, limpando a casa e lavando roupas, vai vendo, e quando encontro o sentido "experiência imediata", afasto a leitura e fico mirando 4 potes de textura que comprei para pintar a casa.
Paradoxo louco?
Vai saber!!?
Vem me dar uma força psicológica na quarta feira?
Vem sim, Mariana.

Beijo sem raspadura, mas
nem porisso de quindim, rss