sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Este ofuscante objeto do desejo



- Eae, firmeza? Coloque o som do Cohen, elas gostam, e que se dane o cenário.
- Veja a japa. Tá babando.
- Hoje de manhã minha mãe me pegou de meia arrumando o lustre da sala.
- Ressaca?
- Não dormi.
- Tem que se foder, voce fala demais.
- A Marina perdeu o avião, porra, me ligou. Voce sabe.
- Acho que vou beber um vinho.
- Nada. Pensei em futebol, mas é sacanagem.
- por fora.
- Voce sabe que para mim voce é carioca, ae. Seu fluminense está só o pó.
- Se fosse carioca, seria Flamengo. O Fluminense, não sei. É tudo empresa. Não gosto de futebol.
- Voce não escreve como fala. Está parecendo Paulista.
- Meu pai é de Mato Grosso.
- Como fala seu pai?
- Quê papo furado, Devir. Olha a caranga chegando.
- To fodido, eu que nem tenho faculdade nenhuma.
- Voce vai discursar?
- Não pretendo, mas estou com um tema na cabeça.
- Lá vem.
- Pode crer, pode ser uma boa.
- O quadrado redondo que se forma na elipse dos devires?
- Quase redondo, em torno ou em forma de pirâmides.
- Quase fantasmas, quase sombras...
- Parece que eles gostaram do jardim.
- Vou fingir que gosto muito de televisão.
- Nesta hora vai ficar estranho gostar de desenhos.
- Estão desenhando umas meninas gostosinhas. Voce viu a nova Mônica, estupidamente gostosinha, é o sonho daqueles muleques que querem uma namorada para garantir sua participação tranquila no pátio das escolas.
- No Brasil não se fala em sexo. Adulto, basta falar, é pedófilo. Aposto que ainda o cebolinha na bate punheta, nem o cascão, voce acredita?
- Claro, ele nunca lava as mãos. Quando crescer vai virar político. Veja o Lula
- Porra, o cara não tem medo de água. Desliga a televisão.
(°°)
- Qual dos dois tem medo de água?
- Responde ae, Cara.
- Eu sou mudo. Manda vê voce, provocou a Deusa, não vai fazer feio.
- E a Marina?
- Está lá no quarto.
- O que vai sair daqui desta cozinha? Vou lá falar com ela.
(°°)
- Quando voces chegaram?
- Neste instante.
- Já encheram a cara?
- Por quê, gordo, vai encarar?
- Dona patroa está ae. Põe uma carinha só daquela sua cachacinha, voce a trouxe?
- Ainda não. Deixa eu trocar uma idéia ali com a Marlene.
(°°)
- Devir já está aborrecido?
- Nem, deve estar chapado desde ontem.
- Ele se sente uma tragédia o tempo inteiro, recolhendo mortos envez dos feridos.
- Tá pirado, gordo. Devir não recolhe nem os vivos.
- Devir é cruel, antes, durante e depois dos nomes. Antes dos nomes não existia nada, cassete!??
- Esta suposição é que ferra tudo, disse ele. A incoerência, ou mesmo a desordem não são supostas.
- Quer dizer que existe uma incoerência e desordem, por exemplo, em eu tomar dois copos?
- Vai se fuder, pergunte para ele.
- Hoje vou colocar o dedo na testa dele.
- O que voce vai perguntar?
- Assim, bem sério e ao mesmo tempo relaxado naquela minha cadeira especial: Vai haver alguma mudança na economia do país? Vai haver país? Ou vamos só cantar "Que país é este? Que país é este?"?
- Se voce for sacaneá-lo, vai arrumar pra cabeça.
- Pelo contrário, eu quero saber, quero saber se ele pensa como revolucionário.
- Uhm, voce já arrumou ou a cachaça já fez efeito.
(°°)
- Salve, pessoal.
- Como anda seu coração, poeta?
- Rastejando para não ser visto?
- Eu estava no avião escondendo-me no espelho da classe econômica, num certo momento queria voltar, não sei o que faço aqui.
- Não começa, a classe executiva é bem caliente.
- É mesmo, salve Jorge!
- Salve! Quê suas armas e almas sejam sempre de paz.
(°°)
- Eu sei que voce tem uma família, que isto é uma coisa que parece ser muito superior que a vida.
- Meu marido está achando tudo tão maravilhoso; isso eu jamais esperaria.
- Está sentindo vertigem?
- Devir, eu capotei e nem percebi. Minha filhinha, ontem, me acordou com tapinhas, beijinhos, ela mais parecia uma zumbizinha apaixonada pela vida, ela me trouxe margaridas tão brancas, linda, e me disse que hoje seria o meu grande dia, e dela também. Socorro, devir, não consigo nem me mexer daqui, mas já não é mais pãnico ou espanto, eu sinto que é a minha participação na vida e que está dando tudo tão certo, e é tão bom, tão, socorro, devir.
- O que eu posso fazer por voce?
- Por favor, não faça absolutamente nada, faça só que vem fazendo, me deixe aqui, aqui estou bem, eu só quero poder observar voce como sempre fiz.
(°°)
- Eu sou professora de física lá na minha cidade, há tempos venho acompanhado o que vem ocorrendo, não sei, nunca falei com o devir, mas fiquei intrigada com aquele negócio de simpatia radioativa, logo depois pede uma redação impossível até para universitários.
- Física? Não tem nada a ver com educação física, esporte, academia, saiu dessas áreas eu já não entendo nada. E admiro muito outros conhecimentos, minha espôsa é Bióloga. Veja só, a minha ignorância, ela faz parte de um projeto para não só tratar e prevenir a gripe em geral, como para erradicá-la do planeta.
- Mas esta é a beleza da natureza, juntar seus contrários para se completarem.
- Com certeza, voce chegou na minha área, onde meus conhecimentos vão adquirir importância.
- Por quê, desculpe-me, mas acredito que todo conhecimento é importante.
- Acho que eu preciso aprender mais sobre a natureza da beleza, porque, por exemplo, nas minhas academias, escolhi lugares os mais diferentes possíveis, e minhas clientes buscam a mesma beleza, um mistura entre virtual e natural, de um lado a tão maldita beleza americana, com sua delicadeza sacana inexcrutável, e de outro lado, uma delicadeza animal e muito forte e imediata, desafiadora e explosiva.
- Está se vendo o quanto as idéias do devir pode perturbar as pessoas. Então, voce escolhe, voce consegue escolher?
- Só se for pensar ou não pensar?
- Para não pensar, qual das beldades voce prefere?
- Segundo pude não matar para entender, a menos óbvia.
- E qual seria a mais óbvia?
- Preciso dizer?
(°°)
- Eu não sei, acho que ele sonha em um futuro muito distante.
- Então já esta morto?!
- Rss, não sei. Todo lar tem uma janela na escada, pode ser qualquer escada.
- Na minha casa tem uma janela na escada da frente. Minha janela é a rua.
- A minha é uma flor, bem cuidada, porém em um vaso muito antigo, que meu tio trouxe da China. Disse ele que é do tempo de Confúcio.
- Esse ae combina com o devir, com certeza.
- Eu não entendo por que o devir não fala em sincronicidade logo de uma vez.
- Aonde voce vê sincronia nisso tudo, está mais parecendo "clube de leitura".
- Acho que o devir não precisa ser determinado, nem estudado.
- Sabe que eu já tinha pensado nisso, ele precisa não ser percebido.
- Eu como fazemos quando estamos diante dele?
- Eu olho na cara dele, nos seus olhos e vejo que ele não sabe o que fazer quando uma mulher está diante dele sem atacar ou querer a paz.
- Voce é maldosa, não é à tôa aquela foto da Blair.
- Bruxinha, minha cara, desacreditada da vida.
- Nunca vou acreditar, tudo passa um pouco e logo se torna fútil. A vida mortal dessa flor na minha janela sobre a imortalidade insignificante.
- Só porque voce não é uma cerveja não vai ficar ae escondendo o mais lindo sorriso daqui.
(°°)
- "Tudo que é sólido, pode derreter." Tem algo a ver com estas "expectativas irreais".
- Não se pode esconder a "servidão involuntária" que a vida esconde e ficar cuidando apenas dos próprios problemas.
- Concordo, mas quem é voce?
- Ah, rss, sou apenas uma vesguinha, uma mosquinha na sopa que o devir me fez certa manhã.
- Explodiu, entrou em choque, correu?
- Nem disse tiau, sequer olhou a careta que eu fazia para ele, e, imagine, para su'a sopa de carne de coelhos'.
- Puta cara escroto, isso é.
- Não fala assim.
- Lembrei de um filme do Woody Allen. O Barcelona. Ele sofre igual o cara lá. Escroto porque ama uma mina escrota.
- Voce falando assim está dando bandeira. Não existe ninguém escroto, desprezível e nerd completo.
- Bandeira de quê, menina malukinha?
(°°)
- É verdade que sua radiação não chegou até a Adriana Calcanhoto?
- Como bem cantou a Vanessa, são expectativas tão rreais que existe prazer só em observar os olhos.
- Entendo, não como se fosse um espelho. Por que voce omitiu o "i" da realidade?
- Naquele tempo era só ela, agora são ambas.
- Ela e a Vanessa da Mata?
- Quase.

3 comentários:

Anônimo disse...

Curta-metragem! Fui vendo as cenas e os personagens! Muito bom!

Sumi uns dias, abduzida por uma gripe que transitava entre a suína, pneumonia e bronquite.

Anônimo disse...

Ahhh, quase achei que esta ilustração era minha!

Devir disse...

A ilustração diz tudo
mas o tudo é nossa alma
essa não vai
se não for verdade!

Melhoras, querida Roberta.