sábado, 5 de dezembro de 2009

Do coração das bestas

Bastardos ou inocentes?




Mafalda: "O que tem nesse recado de jornal, Manolito?"
Manolito: "As cotações do mercado de valores"
Mafalda: "De valores morais? Espirituais? Artísticos? Humanos?"
Manolito: " Não, dos que servem para alguma coisa"
(Quino, Toda Mafalda, editora Martins Fontes, 1991)

Aconteceu em 1984, um grito "não identificado"
"No segundo minuto o Ódio chegou ao frenesi.
Os presentes pulavam nas cadeiras e berravam a pleno pulmões, esforçando-se para abafar a voz alucinante que saia da tela.
A mulherzinha do cabelo de areia ficara toda rosa, e abria e fechava a boca como um peixe jogado à terra.
Até o rosto másculo de O'Brien estava corado.
Estava sentado muito teso na sua cadeira, o peito largo se alteando e agitando como se resistisse ao embate duma vaga.
A morena atrás de Wiston pusera-se a berrar "Porco! Porco! Porco!
De repente, apanhou um dicionário de Novilíngua e atirou-o na tela.
O livro atingiu o nariz de Goldstein e ricocheteou; a voz continuou, inexorável.
Num momento de lucidez, Winston percebeu que ele também estava gritando com os outros e batendo os calcanhares violentamente contra a travessa da cadeira.
O horrível dos Dois Minutos de Ódio era que, embora ninguém fosse obrigado a participar, era impossível deixar de se reunir aos outros.
Em trinta segundos deixava de ser preciso fingir.
Parecia percorrer todo o grupo, como uma corrente elétrica, um horrível êxtase de medo e vindita, um desejo de matar, de torturar, de amassar rostos com um malho, transformando o indivíduo, contra a sua vontade, num lunático a uivar e fazer caretas."

Eu não sei nada de filosofia nem de matemática, muito mal sei escrever. Não entendo nada de arte nem de sexo. E pior, não sei nada de amor, também como disciplina, o que faz, sinto, todas aquelas disciplinas estéreis, para gestar pessoas ímpares: os monstrinhos domados, aqueles que darão falsa legitimidade ao sistema, e os monstrinhos indomáveis, aqueles que vomitam na gravata do papai, que darão verdadeira legitimidade ao sistema.

De todas as disciplinas, eu só ressinto não saber nada da disciplina da matemática, esta que é inapelável e radicalmente contra o verdadeiro amor; e ambas são o melhor exemplo daquela oposição amistosa dos primeiros anos de vida das pessoas.
Mas... O bom costume de família, a boa tradição de propriedade e o cagaço, recomendam não falar dos monstrinhos porque são sagrados pela disciplina religiosa.
O conhecimento também é um lugar sagrado, um templo de palha para esconder agulhas sagradas, raras, aquelas que vão coser o trigo, a matemática transcendente e o amor imanente.

E eu, que nada sei, fico o tempo todo no co-senso hipertextual, descobrindo fórmulas obscuras, metáforas rasteiras para tentar explicar a maneira mais fácil de estudar, ensinar e encontrar uma agulha num palheiro.

A palha, ou o joio, são o conjunto de números pares, como pessoas sem diferenças significativas entre si. O trigo, ou a agulha, são os números ímpares.

Jamais vou mentir, enquanto omitir é uma festa e sei controlar o meu entorpecimento, rss.
Podem acreditar, estou de saco cheio de "amar" à força de marteladas televisivas, heróis (ou monstros?) midiáticos, pessoas anônimas ou não.
E em cada canal (só oficial? Não pago para me comprarem)contém seu próprio saco deles.
E a televisão é só um bode expiatório aqui, do sistema, não é uma ou outra pessoa. Justiça, atenção!

E como tenho a mania de querer entender como a pessoa consegue ser feliz, e isso não é possível de fora, preciso entrar em seus corações.
O coração é, não de todos, é claro, talvez o único castelo que ainda restou, onde a tradição, o culto à "verdade do rei da selva" ainda não sofreu sequer um tremor.
Óbvia e sutilmente, portanto, o "coração de leão" é o mais adorado.

O meu alvo e sentido inexpugnável, rss, outro óbvio, porque quase na totalidade das pessoas, monstrinhos ou não, só são felizes enquanto adoradas.
Eis o meu problema, o mamute que preciso caçar quando acordo, se acontecer sequer uma noite de sono.

Eu, antes perdoe-me a intimidade impertinente, nunca consegui espelhar-me a qualquer animal da Terra.
Talvez porque jamais gestei um coração, ou uma interioridade - versões compactas para presumir a Vida - estou em apuros; como invadir um leão sem que me identifique, sem que eu explique e sem que eu me mostre.
Seu espelho, ao contrário do costume e culto, é a entrada mais vigiada, a entrada principal.

Por que será? O invasor, do coração, vai roubar a adoração, do leão, ou sua tristeza? Por que não todos os animais podem ser o "Rei"?

Ah, a força!!! A disciplina!!! O poder!!!

Nada mais óbvio, portanto, que, na imagem de outro leão, serei combatido até a morte; e isso não quero (mas, então, que seja pelo menos por gentileza, e não me confundam com hospedeiro; o ócio e o crime também são disciplinas, porém que se aprende somente na rua; só na rua?, rss, acredito).

E eu posso, como pensam as pessoas, não ter coração, interioridade, sensibilidade, amor, ou seja lá que inferno de apenas nomes!, que usem para legitimar preconceituosidades, rss, se não sou assim tão bobo, também não sou assim tão imbatível.

Seu espelho, seu outro abstrato, jamais, porque, embora não sendo assim feliz, como leão, sua tal felicidade só quero estudar, e se rolar de somar, firmeza, e o resultado for par, paciência, será o nome de nosso amor.

Ou, se for ímpar... sem palavras.

Seria muito deselegante para mim apenas caracterizar a felicidade do leão como esquisofrênica/monstruosa, e todas as variantes deste conceito legalmente suspeito, e partir para outros estudos; assim como faz leoas e inferiores em força.

Eu quero viver seu coração para realmente saber como consegue ser feliz, enquanto seus pares só sobrevivem se absorverem tal imagem de rei da selva.
Quero poder separar o joio do trigo, mesmo que me submeta a procurar uma agulha num palheiro, sem incendiá-lo, é claro.
E se eu simplesmente tomar de um imã, estarei incorrendo ao erro e abuso de uma máquina, assim como exemplo é a televisão, tão facilmente confundida com a realidade do leão.

E, também, perderei definitivamente a simpatia e participação sutil e significativa das pessoas ímpares.

Jamais vou mentir, enquanto omitir é uma festa; sei controlar o meu entorpecimento e não aceito, rss, apenas dois minutos de ódio.

Que a axiologia, com seu sorriso excitante, me perdoe!



Um contra todos, quem sou eu? Bastardo? Inglório?
- Sou Alemão?
- Não.
- Sou um americano?
- Não.
- Espere um minuto, ele seria..
- Obviamente, ele não nasceu na América.
- Então... Eu visitei a América?
- Sim.
- Essa visita... foi casual?
- Não para você.
- Minha terra natal... poderia ser chamada de exótica?
- Sim.
- Isso pode indicar uma selva ou o Extremo Oriente.
Descartarei meu primeiro instinto e perguntarei, sou da selva?
- Sim.
- Srs., a esta altura poderiam perguntar se é real ou fictício.
Mas como é muito fácil, eu não perguntarei ainda.
Certo, minha terra natal é a selva?
Eu visitei a América, mas não planejei, entretanto, alguém planejou.
Quando fui da selva para a América, eu fui de barco?
- Sim.
- Eu fui contra minha vontade?
- Sim.
- Neste trajeto de barco eu estava acorrentado?
- Sim.
- Quando cheguei na América, fui exibido em correntes?
- Sim.
- Sou a história do negro na América?
- Não.
- Então devo ser"...
(Bastardos Inglórios, Quentin Tarantino)



Brega: romanticusão?
"Com a mesma falta de vergonha na cara eu procurava
alento no
Seu último vestígio, no território, da sua presença
Impregnando tudo tudo que
Eu não posso, nem quero, deixar que me abandone
Não posso, nem quero, deixar que me abandone

Não posso, nem quero, deixar que me abandone não
Com a mesma falta de vergonha na cara eu procurava alento no
Seu último vestígio, no território, da sua presença
Impregnando tudo tudo que
Eu não posso, nem quero, deixar que me abandone
Não posso, nem quero, deixar que me abandone

Não posso, nem quero, deixar que me abandone não
São novamente quatro horas, eu ouço lixo no futuro
No presente que tritura, as sirenes que se atrasam
Pra salvar atropelados que morreram, que fugiam
Que nasciam, que perderam, que viveram tão depressa,
Tão depressa, tão depressa
São novamente quatro horas, eu ouço lixo no futuro
No presente que tritura, as sirenes que se atrasam
Pra salvar atropelados que morreram, que fugiam
Que nasciam, que perderam, que viveram depressa,
depressa demais
A vida é doce, depressa demais.
A vida é doce, depressa demais.
A vida é doce, depressa demais.
E de repente o telefone toca e é você
Do outro lado me ligando, devolvendo minha insônia
Minhas bobagens, pra me lembrar que eu fui a coisa
mais brega
Que pousou na tua sopa.

Me perdoa daquela expressão
pré-fabricada
De tédio, tão canastrona que nunca funcionou nem
funciona
E de repente o telefone toca e é você
Do outro lado me ligando, devolvendo minha insônia
Minhas bobagens, pra me lembrar que eu fui a coisa mais brega
Que pousou na tua sopa.

Me perdoa daquela expressão
pré-fabricada
De tédio, tão canastrona que nunca funcionou nem
funciona me perdoa a vida é doce
me perdoa a vida é doce
Me perdoa, me perdoa, me perdoa

São novamente quatro horas, eu ouço lixo no futuro
No presente que tritura, as sirenes que se atrasam
Pra salvar atropelados que morreram, que fugiam
Que nasciam, que perderam, que viveram tão depressa,
Tão depressa, tão depressa

São novamente quatro horas, eu ouço lixo no futuro
No presente que tritura, as sirenes que se atrasam
Pra salvar atropelados que morreram, que fugiam
Que nasciam, que perderam, que viveram depressa,depressa demais
A vida é doce, depressa demais
A vida é doce, depressa demais..."
(A vida é doce, Lobão)

5 comentários:

432 disse...

eu te comparo a Divid LInch, vejo seus texto da mesma maneira que vejo o filmes dele, principalmente o ultimo. Embora seja evidente que a conteudo, e muito, a corrente de ideias, o proposito do todo, não consigo compreender, entender.
E sem isso é quase impossivel (minha opinião) seguir a historia, os sentimentos.

Entrar no coração do mais adorado, só para sentir a felicidade dele, sem todo o resto, pra que? Estou na faze de que todo o sentimento traz sofrimento, até a felicidade, pois normamente o que a sustenta não é permanente e não suportamos a perda. Mas a perda é tão insuportavel, por que só com ela realmente a aprendemos a olhar pra nossas escolhas, mas tem o lado bom nisso tudo... Se adão e Eva não tivessem sido expulsos do paraiso nunca teria aparecido Jesus.

Acho que é isso,
inté.

Devir disse...

Enzo

Já encontrei vários professores, que sabiam escrever muito bem quase nada 'de novo', que me corrigiam erros banais somente para não afirmar minhas palavras.
Como fiquei tentado ao ler seu comment; mas aqui isto não é o importante; ou é, depois da história, bem depois dos sentimentos.

O Brasil, tem bem mais urgências; voce compreende e me desculpa?

Não quero ser antipático, para depois soprar algum ferimento, e fazer disso meu território.
Meu território não tem limites, assim como a vida, nunca é demais para mim, tampouco de menos para os outros.

"Entrar no coração do mais adorado, só para sentir a felicidade dele, sem todo o resto, pra que?"
Cara, que pergunta!!!
Sinto uma enorme alegria, uma pergunta dirigida à toda a civilização(raça humana), e para mim, agradeço muito, muito, muito.
Principalmente porque ao ler meu texto, voce já sabe a resposta.
Entrar no coração do adorado, ou do mais ou menos adorado, rss, para lhe 'roubar' sua felicidade - realmente é uma questão insensata - sem que o resto não a acompanhe, é uma piada para fazer chorar, talvez, quase toda a civilização. E isso tem muito a ver com o aumento da criminalidade e do absoluto discuido com o planeta.

Sua questão final balança as torres - e os soldadinhos "snaiper", que em suas próprias particularidade podem ser seus melhores amigos(as) - podem-lhe causar "frustração".

Repare no Google, a apresentação que fazem do 'devir antes dos nomes', na pesquisa geral. Guerra franca, e isso me legitima a continuar; talvez preciso apenas sublimar melhor meus ódios contra o 'estado de coisas'.

Não é inacreditável, e todo mundo acredita, rss, que o amor é o outro lado da moeda do amor? Toda moeda perde seu valor se se raspar um lado? Ah, moeda?

O que seria da poesia sem o ódio contra a estupidez do sistema, em Drummond, por exemplo?
O que seria da MPB sem o ódio contra a ditadura do sistema, em Chico Buarque, por exemplo?

Peço-lhe atenção porque sei que ciúmes e a inveja são disciplinas tanto de amor quanto de ódio; e muita gente sabe ler e escrever muito bem, para parecer inofensivo e bacana, e não sentir ódio, nem amor, "por nada".
Portanto, sentir ódio ou amor não são questões, porque a questão é o que se faz ou se deixa de fazer por eles.

Ódio, talvez, nem na psicopatologia se acredita que se origina do nada, ou da própria doença em si.

Quem não é capaz de enxergar muito ódio em Baudelaire, principalmente nas suas Flores do Mal? "Em 1857 é lançado As flores do mal contendo 100 poemas. O livro é acusado no mesmo ano, pelo poder público, de ultrajar a moral pública." (Wikepédia)
ps. voce precisa aparecer, filho, para trocar a placa de som. Leu que publiquei aquela sua tradução daquela música do Dylan, que fez na raça, quando passou aqui, semana passada?

Beijo, e volte sempre.

Devir disse...

Perdão, errata:
que o amor é o outro lado da moeda do ÓDIO?

Anita Mendes disse...

tentar entender o devir 100% seria descobrir a oitava maravilha do mundo!(rs)
ps: adoro a mafalda!
e adoro o devir!(meu cartoon-amerobrasileiro preferido)rs
beijos doces com gosto de re-descobrimento.

Devir disse...

Oh minha ameramada, Anita
Aonde eu errei?rss
Quantos sonhos tive
juntos
após vencido as tolices
e as tolices da impressão/expressão
e o tédio mesclado àquele medo
medo de perder o que não se tem ainda, numa mesinha de bar
as pernas mancas, um copo que cai
voce dizendo "calma calma
isso acontece" eu dizendo "claro
algo sempre acontece" eu
levanto e te beijo na boca
rss sem nenhum motivo...
porque é como digo neste post
todos os motivos não são nossos
somente os emprestamos
ao ódio ou ao amor...

odeio elogios, rss
(fora do pé do ouvido)

beijo