sexta-feira, 18 de setembro de 2009

"Amor virtual é um saco"


Por que não enxergamos apenas o véu?
Por que não nos perguntamos qual era o prazer de vesti-lo?
Mas de repente, ficou tarde.
Em meio a tantos amores
que vão ficando tarde até neste momento.

Aonde vão parar todos os véus?
E não adianta esperar a resposta,
confortavelmente fingindo não ouvir Air on a G String
tocando dentro do próprio véu.

E não adianta sequer construir palácios poéticos,
castelos de ficção, não adianta
se tornar o mitológico arqueiro inglês
e inverter todos os cursos d'águas,
levantar diques, exportar
perícia e localizações de alvos fáceis
ou prestes a servi-lo, não adianta
qualquer visibilidade a conquistar
pelos mecanismos mais sutis da natureza, não...

Não, quando amores preferem partir
e vão se deixando ficar confortavelmente.

Sem respostas, como ansiamos
que não houvessem perguntas!

Nos tornamos assim o velho fantasma da ópera,
toccata e fugue in D minor, Bach, especialistas
em pequenos espaços, em quase instantâneos
de descanso, jamais cansados, dissimulando
apenas o mais exasperante vício de ficar só.

Só, para vasculhar baús de dores,
antes amores que tiveram suas chances,
que vestiram véus sem prazer,
sem desejos, sem sentimentos,
véus mentirosos mesmo que jamais mentiram,
assim como é toda arte simulada por razões veladas...

Qual é a razão que a arte, nua, pode exigir?

Quantas vezes a arte se faz uma pessoa?
E quantas vezes essa pessoa poderá suportar
a nossa ânsia
de verdade, de véus
apenas para nos 'demasiar'
sem jamais sabermos por quê?

Por que a nudez se tornou este signo, este paradoxo do desejo,
esta dicotomia do vício,
isto obscuro, velado, misterioso e premente?

Por que João Gilberto que conhecia o segredo do sucesso,
se tornou o próprio véu, a própria arte,
sua própria vida
demasiadamente humana e original?

Por que Cat Power, em Sea of Love, é capaz
de apaixonar até quem não sabe o que está dizendo?

É a arte, ou a mulher, nua, que nos envolve,
ou é um produto social, perfeito,
ou justamente um defeito,
a coisa mesma,
nua, sem véus, sem instruções?

Precisamos saber o que diz a canção Karma Coma,
Trick & Massive Attack, para pensar -
"engraçado voce lembrar de mim nesse instante do texto"
- decidir -
preferir a arte pela arte, e não se toca mais no assunto?
"Que véu voce 'vesta?"

"O que voce prefere, a arte ou a mulher,
qual das duas nuas?" É o que tememos
em Fernanda Torres se nos despimos completamente?

E Holiday cantava apenas para nos advertir.

A arte dói,
a nudez nos corrói,
o véu é nossa mortalha,
a morfina é o mais falso amor
e sem este não conseguimos viver.
"Mas amor virtual não é um caso! Falei?"
§
Olha que a vida tão linda se perde em tristezas assim
Desce o teu rancho cantando essa tua esperança sem fim
Deixa que a tua certeza se faça do povo a canção
Pra que teu povo cantando teu canto
Ele não seja em vão
Eu vou levando a minha vida enfim
Cantando
e canto sim
E não cantava se não fosse assim
Levando pra quem me ouvir
Certezas e esperanças pra trocar
Por dores e tristezas que bem sei
Um dia ainda vão findar
Um dia que vem vindo
E que eu vivo pra cantar
Na avenida girando, estandarte na mão
Pra anunciar

10 comentários:

Luciano Fraga disse...

Amigo Devir,esqueci do caro.Outro dia li que a palavra love vem do sânscrito lobha, que significa cobiça.Dizem que não é uma coincidência, que deve existir uma razão alquímica por trás disso.Então, love, lobha, amor, é acumular, desejar, cobiçar o que mesmo?O outro(a), a coisa? Socrates diz:"uma pessoa que pratica os mistérios do amor estará em contato não com um reflexo , mas com a própria verdade..." E a verdade pode emergir da consciência e não do corpo, mas na maioria das vezes arrancamos este véu e o contato e a manifestação sensual do corpo confunde-se com amor e nesse momento ficamos completamente confinados a alguém.Corremos atrás delas e honestamente prefiro todas elas nuas e cruas: as mulheres e a arte,e morreremos certamente sem "sentir dor", forte abraço

Marcia Barbieri disse...

Maravilhoso poema filosofia,dificil falar alguma coisa depois do lido,estou entre o véu ,a arte e a nudez, não posso dissociá-los e separados não encontraria jamais o amor. O amor é uma mentira velada.

beijos

Devir disse...

Meu, amigo/inimigo, ora caro
ora barato, Luciano Fraga, este
comentário é por excelência de
muito bom gosto, apesar de que continua ainda no limite da neutralidade do "condomínio".
Não convoca nem devota, nem mesmo
para si, cumpre somente a funkção;
o afinal desvelo da semana de 22.

Mas, contudo, é uma substâncial
migalha de lhoba

obs., o pecado de pousar em vossos
espaços tão telúrico.

Devir disse...

Marcia, não há dissociação mesmo
para ninguem
"não importa o alheiamento"
e não tem como nem pensar
outra alternativa.

Devir disse...

Manifesto Antropofágico

Todo mundo então entendeu
e comeu, comeu
e continuam comendo, comendo

O quê, parou?
Voce também?
Honestamente
quero acreditar.

Luciano, quero acreditar
que destemido
lhe cai bem melhor
que poeta
e claro, nem preciso dizer
que ambos
só podem ser superados
pela coisa em si

Marcia,

Luciano Fraga disse...

Caro amigo Devir, agora sim com todas as regras de protocolo(rs).Eu digo "eu não sou" e não quero ser esnobista, porém ao romper comigo parece que imprimo uma ideologia individualista, mas também "não sou" pólvora combusta, você dispõe de uma Magnum , não sei o calibre, recheada com balas de festim e vejo que seu mundo pictórico é uma tentativa de ser romântico, como dizia Warhol:"tudo é nada" e " nada é excitante, nada é sexy,nada não é embaraçoso".E S. Beckett disse que " amizade é um artifício social, como o estofamento de uma poltrona, não tem significado espiritual" e mais para o artista(em todos os sentidos) a rejeição da amizade não é só razoável, é uma necessidade, porque a renovação espiritual se dá no sentido profundo" A arte é a apoteose da solidão.Estamos sós, você deseja guerrear com quem? Eu quero com meu ego, transgredi-lo e deixá-lo em pedaços, eis um convite.Que tal exterminarmos todos os atributos de um ser humano ou preferes do ser virtual? Forte abraço.

Devir disse...

Eu tomei seu comment anterior
como um lance de "xadrez virtual"
P4BD, com certeza a melhor resposta, então joguei o gambito invertido, P4D, e fiz um manifesto
apenas (jogador amador) para desconcentrá-lo.
Agora, voce aceitou o gambito!
Então jogo, P5BD!

Porque as dissociações atinge seu ápice nesse tempo, quando até os véus produzem suas próprias dores físicas - meu primeiro contato com a filosofia se deu ao livro As Dores do Mundo, do Shoppenhauer - minha resposta é, para a sua pergunta
"Que tal exterminarmos todos os atributos de um ser humano ou preferes do ser virtual?"
atravessar o limite do 'tabuleiro'

Obviamente: estamos falando a mesma língua, ou as mesmas línguas de sempre?

E óbvio também é preciso que se entenda, de vez, que virtual não é necessariamente somente parte do véu, que o é quase exclusivamente um "atributo" do ser humano.

Consequentemente, a realidade.

Só aonde o ser humano se omite, nas pregnâncias do véu, por exemplo; não tenho uma Magnum, tenho uma menina israelita com a pele de porcelana fina, sapata 9, prada, vai vendo, seu amor se reserva para decisões de estado.
Não existe discurso Datena!
Não existe combustão espontânea!

S. Bechett fala diretamente da fonte, da origem, dos princípios do dissocialismo, ideologia que me ocorreu saudável na juventude, mas encareceu minha alteridade.
Como se pode ser altero e pegar onda tão galinha de possuir carro cada vez "melhor"?
Ou viver com uma mulher exclusiva, sem se importar com outras variações de morte, até que a literal faça justiça? Não é à toa que, em alguns lugares do mundo rss real, ainda o adultério é comemorado com a morte, representado pelas honras sociais.

Atributo = desenvolvimento do ser
Véu = estagnação dos atributos
Realidade = virtualidade do mundo
Ser = experiência imediata

Forte abraço

Devir disse...

Marcia Barbiere, suponhamos que voce entrou na partida também, e seu comment foi P4D.
Claro, respondi PxP, são momentos que jamais falo, raramente emito algum gemido, normalmente a respiração investe montanha acima.
(Existe manual de escalagens?)

Beijo terno

Anônimo disse...

Querido Devir, as distâncias medidas em Kbytes ou metros, tanto faz, é provavelmente o que torna os amores um saco!

Devir disse...

Estas 'sem medidas ou
medidas dispensadas' são
apenas outros intêns...