quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Coisas melhores do que beijos, agora

FOTO DO GATO NA CADEIRA DE ARQUIVO DO MEU FILHO

{todos estão convidados a jogar com as peças escuras, a partir do segundo lance cada partida não se envolverá em outra}

1º Lance = P4BD

Desde muito criança eu já pensava que psicologia é coisa de frescos e frescas, estou bem próximo dos cinquenta anos e ainda continuo achando estes tipos de pensamentos tolos.
Mas antes vamos lembrar um pouco, não há outro meio de satisfação na metáfora do que enfim enterrar passados.
Dinheiro só achei uma vez, era uma nota de dez em um tempo que eu refletia muito pouco, significava simplesmente que eu podia comprar dez veses uma coisa que custasse uma nota de um. A reflexão, até hoje, para mim, é um refinado estado de espírito que se reflete em qualquer parte do corpo.
Lembro da minha alegria, eu queria até que o mundo inteiro ficasse sabendo, e isso foi, certeza que também carrego até a morte, a razão de ter perdido aquela nota de dez, fato desagradavelmente requintado na memória, porque aconteceu no momento justo da prova que não devemos nunca dividir nossas alegrias, eu demorei tanto para gastar, talvez para manter o maior tempo possível meus 15 minutos de fama, quando comprei dez doces de dez sabores diferentes, na hora de pagar, o dinheiro havia sumido.
Na forma de lembrar o passado, na forma de sincronizar as lembranças, os fatos, este com aquele, uns com outros - sem se importar em conhecer a forma de construir a memória, nesta inconsciência também ignorada por capricho ou preguiça - percebi que sempre a motivação do talento inato fora corrompido.
Não importa o campo onde viesse atuar, na pintura, por exemplo, muito cedo, diz-se precocemente, depois daquele ensaio geral feito exercício muscular, no momento quando me vi capacitado a portanto criar um próprio gênero, alcançar minha linguagem pictórica essencial, caiu em minhas mãos, literalmente do céu porque em momento e lugar certo, numa revista de refinada qualidade gráfica, fotos de inúmeros quadros de Salvador Dalí.
Daí em diante, refleti de maneira sui generis que melhor faria para para a civilização, pelo menos do meu tempo, era não mais tentar, na pintura, desenvolver determinada linguagem, porque o objetivo fora alcançado e mais do que fêz o surrealismo, em Dalí, seria devaneio inócuo.
Na literatura, exclusivamente na ficção, ocorreu exatamente a mesma coisa. Devo ter exercitado-me por talvez uma década ou mais, então novamente no momento certo e lugar certo, enfim conheci Rubem Fonseca. Refleti e decidi, o melhor da ficção, daqui para frente será devaneio à toa.
Só em momentos de extrema necessidade, e quando as alternativas diminuem ao mínimo, uso banheiro público. Foi na segunda vez da Feira da Vila Madalena - muita gente, neste instante do texto, mastiga uma deliciosa saudade -, na padaria da esquina da rua Wisard com a Fradique Coutinho; feliz ou infelizmente, hoje vestida de prada.
Procurei desesperadamente pelo menos uma seda, não encontrei, ou melhor, só encontrei uma - guardem esta imagem como talentosa metáfora do devaneio. Então, alguém havia deixado cair, já toda pisoteada, uma pasta de papelão, com decalques e tudo na capa, que deveria servir às minhas necessidades extremas do momento.
Mesmo antes de abaixar a calça até as canelas, olhei o conteúdo da pasta, 14 páginas grampeadas xerocadas do conto O Cobrador, de Rubem Fonseca.
Quando eu sai daquele banheiro de todo imundo, ficção nenhuma, nada mais deveria escrever, se tivesse que fazer melhor.
E são inúmeras lembranças semelhantes; quis ser jogador de futebol, então assisti um jogo do Santos no Pacaembú, um gol do Pelé de bicicleta e tudo; quis ser bombeiro, acompanhei o incêndio in loco do edifício Joelma; também quis ser policial à paisana, para isso então, quis ser psicólogo, psiquiatra e filósofo, como mero exercício de telento antes de propriamente exercê-lo, e aconteceu a mesma coisa; a última coisa que quis, faz pouco tempo, era ser imortal, e ainda estou na fase dos exercícios de musculação, mas não é fácil com toda esta memória ainda sobre os ombros.
O pior de tudo, o que realmente corrompe meu talento, é saber que minha corrupção não serve para mais nada além das pessoas acharem que é frescura, e esta atitude de todos, sem excessão, se repete infinitamente mais do que o total de tudo que eu seja capaz de lembrar, o que talvez me motiva a achar pensamentos, iguais àquele do primeiro parágrafo. Por tudo isso, às vezes até tento refletir-me como um paciente, propriamente necessitado, de terapia psicológica.
Para finalizar este post, então, deixo com voces um fragmento, a parte final do "poema", daquela inexpugnavelmente sensação dentro do banheiro na Vila Madalena.

Hoje é dia 24 de dezembro, dia do baile de Natal ou Primeiro Grito de Carnaval. Ana Palindrômica saiu de casa e está morando comigo.
Meu ódio agora é diferente.
Tenho uma missão.
Sempre tive uma missão e não sabia. Agora sei.
Ana me ajudou a ver.
Sei que se todo fodido fizesse como eu o mundo seria melhor e mais justo.
Ana me ensinou a usar explosivos e acho que já estou preparado para essa mudança de escala.
Matar um por um é coisa mística e disso eu me libertei.
No Baile de Natal mataremos convencionalmente os que pudermos.
Será o meu último gesto romântico inconsequente.
Escolheremos para iniciar a nova fase os compristas nojentos de um super mercado da zona Sul.
Serão mortos por uma bomba de alto poder explosivo.

Adeus, meu facão, adeus, meu punhal, meu rifle, meu Colt Cobra, adeus, minha Magnum, hoje será o último dia em que voces serão usados.
Beijo o meu facão.
Explodirei as pessoas, adquirirei prestígio, não serei apenas o louco da Magnum.
Também não sairei mais pelo parque do Flamengo olhando as árvores, os troncos, a raiz, as folhas, a sombra, escolhendo a árvore que eu queria ter, que eu sempre quis ter, num pedaço de chão de terra batida. Eu as vi crescer no parque e me alegrava quando chovia e a terra se empapava de água, as folhas lavadas de chuva, o vento balançando os galhos, enquanto o carro dos canalhas passavam velozmente sem que eles olhassem para os lados.
Já não perco meu tempo com sonhos.

O mundo inteiro saberá quem é voce, quem somos nós, diz Ana.

Notícia: O governador vai se fantasiar de Papai Noel.
Notícia: Menos festejos e mais meditação, vamos purificar o coração.
Notícia: Não faltará cerveja. Não faltarão perus.
Notícia: Os festejos natalinos causarão este ano mais vítimas de trânsito e de agressões do que nos anos anteriores.
Polícia e hospitais preparam-se para as comemorações de Natal.
O cardeal na televisão: a festa de natal está deturpada, o seu sentido não é esse, essa história de Papai Noel é uma invenção infeliz.
o cardeal afirma que Papai Noel é um palhaço fictício.

Véspera de Natal é um bom dia para essa gente pagar o que deve, diz Ana.
O Papai Noel do baile eu mesmo quero matar com o facão, digo.

Leio para Ana o que escrevi, nosso manifesto de Natal para os jornais.
Nada de sair matando a esmo,
sem objetivo definido.
Eu não sabia o que queria,
não buscava um resultado prático,
meu ódio estava sendo desperdiçado.
Eu estava certo nos meus impulsos,
meu erro era não saber quem era o inimigo
e por que era inimigo.
Agora eu sei.
Ana me ensinou.
E meu exemplo deve ser seguido por outros,
só assim mudaremos o mundo.
É a síntese do nosso manifesto.

Ponho as armas numa mala.
Ana atira tão bem como eu, só não sabe manejar o facão, mas essa arma agora é absoleta.

Damos até logo a dona Clotilde.
Botamos a mala no carro.
Vamos ao baile de Natal.
Não faltara cerveja, nem pirus.
Nem sangue.
Fecha-se um ciclo da minha vida e abre-se outro.

4 comentários:

Luciano Fraga disse...

Caro amigo Devir,estou retornando aos poucos, ainda meio baleado(garanto-lhes que não foi da Magnum e sem necessidade de assistência psicológica),mas passo para agradecer-lhes a atenção e preocupação dispensadas, tenho plena certeza que existe coisas melhores que beijo e sal:amizade, esse calor impagável, forte abraço e vamos em frente.

Devir disse...

KKKKKKK vejo que a forma é a mesma
e que ótimo estar bem, Luciano

o discurso Datena é foda!!!

a sutileza do Fonseca é suave!!!

Salvem as psicologias!!!

Vamos sim, sem demora.

Anônimo disse...

Tendo tinta, lápis e papéis, o que faria o menino que ganhou e perdeu a nota de dez?

Quando for a vez dos compristas nojentos da Oscar Freire me chama!!!

Devir disse...

Mais do que reinvindicar
um espaço no ceu!!!

Para que a História
não se repita!!!